TESTEMUNHA DE CID

Ex-comandante do Exército diz que só queria 'acalmar' PM e não impedir prisão em acampamento no 8/1

Em depoimento ao STF, ex-comandante do Exército Júlio Cesar de Arruda afirmou que decisão de adiar prisões foi tomada em conjunto com ministros

Por Hédio Ferreira Júnior
Publicado em 22 de maio de 2025 | 11:09

BRASÍLIA – O general Júlio Cesar de Arruda negou nesta quinta-feira (22) ter impedido a atuação da Polícia Militar do Distrito Federal no QG do Exército onde envolvidos na depredações das sedes dos Três Poderes estavam acampados na noite de 8 de janeiro de 2023. Na ocasião, o militar comandava o Exército. 

Em depoimento prestado ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta manhã, Arruda disse ter coordenado as ações diretamente do Setor Militar Urbano (SMU), em Brasília, onde se reuniu com o então comandante militar do Planalto, general Gustavo Dutra, e o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. O local abrigou apoiadores de Jair Bolsonaro após a derrota nas eleições presidenciais de 30 de outubro de 2022. 

Segundo ele, Múcio chegou ao QG com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, e o então ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino. Lá decidiram com o comando das Forças Armadas que as prisões ocorreriam na manhã seguinte, dia 9. A justificativa, segundo ele, era clara: evitar mortes em uma operação noturna desorganizada.

“Ali estava um clima de nervosismo. A minha função era acalmar. Então eu falei: ‘isso tem que ser feito de maneira coordenada’. E foi feito de maneira coordenada com os ministros Flávio Dino, Rui Costa e José Múcio. Minha função era acalmar”, respondeu ele ao ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito que investiga um suposto plano de golpe de Estado no STF. 

Tensão e blindados no QG

A atuação do general Arruda naquela noite causou tensão entre os comandos militares e o governo Lula. Três blindados Guarani foram posicionados para impedir o o da PM ao Setor Militar, o que alimentou suspeitas sobre uma suposta proteção aos manifestantes bolsonaristas. 

Questionado por Moraes sobre uma frase em que teria ameaçado um coronel da PM dizendo que "a minha tropa é um pouco maior que a sua", o general disse não se lembrar dessa fala, afirmando que o momento era de tensão..

Apesar disso, Júlio Cesar de Arruda foi exonerado semanas depois, em 21 de janeiro. A demissão foi vista como consequência de sua resistência a afastar o tenente-coronel Mauro Cid do comando do 1º Batalhão de Ações de Comandos, unidade de elite do Exército. A indicação de Cid para o posto havia sido feita ainda no governo Bolsonaro.

Durante o depoimento ao STF, Arruda falou também sobre Mauro Cid, a quem defendeu como um oficial disciplinado e não politizado no período em que serviram juntos. O depoimento foi dado como testemunha de defesa do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, um dos principais colaboradores da Justiça na investigação sobre a tentativa de golpe após as eleições de 2022.

Outros seis militares também prestaram depoimento nesta quinta-feira, todos listados pela defesa de Cid como testemunhas. Segundo os relatos, o tenente-coronel respeitava a hierarquia e não discutia assuntos políticos ou os atos de 8 de janeiro. Um dos convocados, o general Flávio Alvarenga Filho, não compareceu.

Além de Arruda, a lista de testemunhas inclui nomes ligados à carreira de Cid na Ajudância de Ordens da Presidência da República e em unidades militares do Exército. 

Outro ponto sensível abordado por Arruda foi o encontro com o general da reserva Mário Fernandes, no fim de dezembro de 2022. Segundo o ex-comandante do Exército, o colega  não foi expulso de sua sala, como noticiado, mas negou qualquer adesão à suposta trama golpista que teria sido apresentada por Mário, apontado como autor de um plano de assassinato de lideranças políticas, incluindo o presidente Lula e o ministro Alexandre de Moraes.

Testemunhas do “núcleo 1” serão ouvidas até 2 de junho 

O STF ouve desde segunda-feira (19) uma série de testemunhas, incluindo ex-comandantes das Forças Armadas e integrantes da Polícia Rodoviária Federal (PRF). A Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou Bolsonaro e outras 33 pessoas por tentativa de golpe, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa. Os depoimentos devem ser concluídos até 2 de junho.

A investigação busca esclarecer o papel de cada envolvido nos ataques de 8 de janeiro e nos bastidores da tentativa de subverter o resultado das eleições de 2022, em que Bolsonaro foi derrotado. Segundo a PGR, o plano tinha liderança civil e militar e era articulado para manter o ex-presidente no poder de forma ilegal.