CONTRARIANDO O STF

Câmara aprova suspensão de ação no STF contra Ramagem por tentativa de golpe de Estado

A ação contra Ramagem no STF será suspensa até o fim de seu mandato; a proposta inclui ainda uma brecha que pode beneficiar outros réus, como Bolsonaro

Por Lara Alves I Lucyenne Landim
Atualizado em 07 de maio de 2025 | 21:35

BRASÍLIA — A Câmara dos Deputados decidiu nesta quarta-feira (7) à noite pela suspensão da ação que corre no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) por tentativa de golpe de Estado. O plenário recebeu o pedido de suspensão ainda no início da noite, depois que a Comissão de Constituição e Justiça votou para proteger Alexandre Ramagem — réu no inquérito do golpe. Com a posição da Câmara, a ação contra ele é paralisada até que o mandato dele termine; ou seja, até, pelo menos, dezembro de 2026.

No plenário, 315 deputados votaram para interromper a ação penal e 143 votaram contra a paralisação do processo. Era necessária maioria absoluta para beneficiar Ramagem; ou seja, pelo menos 257 votos. Após a aprovação, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), promulgou a resolução favorável ao deputado do PL e determinou que ela seja imediatamente entregue ao STF. 

O problema da suspensão, segundo indicou a bancada do PT, é que ela abre uma brecha para paralisar completamente a ação penal, interrompendo todo o trâmite no STF e beneficiando os outros réus — entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Nesse cenário, o PT pretende apresentar um mandado de segurança no Supremo contra o que a Câmara decidiu.

“O que está escrito aqui? Que fica sustado o andamento da ação penal contida na petição 12.100 no STF em relação a todos os crimes imputados. Os senhores sabem o que significa? Significa que suspende tudo, suspende toda a denúncia da Procuradoria-Geral da República. Os senhores estão trancando a ação contra os 34 denunciados”, criticou o líder da bancada do PT, deputado Lindbergh Farias (RJ).

A célere tramitação desse processo sobre Ramagem rendeu elogios da bancada do PL ao presidente da Câmara. O líder da bancada, deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), dedicou uma parte de seu pronunciamento na tribuna a Motta. "Que fique aqui registrada a gratidão do PL ao presidente Hugo Motta por hoje fazer justiça a um de nossos colegas de bancada", disse.

Ramagem é réu por participação na trama golpista identificada em investigação da Polícia Federal (PF) e detalhada na denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR). Em março, a Primeira Turma do STF decidiu aceitar a denúncia contra Ramagem e o tornou réu. As investigações indicaram que ele atuou pró-golpe enquanto era diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Jair Bolsonaro. 

As acusações que recaem sobre ele são de associação criminosa armada, abolição violenta do Estado democrático de direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. A pena máxima pelos cinco crimes chega a 43 anos e 4 meses de prisão.

Ação correu da CCJ para o plenário

A Câmara tinha até 18 de maio para decidir sobre a sustação da ação penal. Mas, o trâmite foi rápido: nesta quarta-feira à tarde, a Comissão de Constituição e Justiça votou a favor do relatório do deputado Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), que aceitou o pedido do Partido Liberal para suspender a ação. À noite, o recurso foi incluído na pauta das votações do plenário, e os deputados o aprovaram, encerrando a discussão.

A ofensiva para proteger Alexandre Ramagem começou com um pedido do Partido Liberal apresentado à Câmara. A legenda recorre ao artigo 53 da Constituição Federal para pedir a suspensão da ação no STF; ele diz que o Congresso pode paralisar processos contra deputados e senadores que se refiram a crimes cometidos após a diplomação.

O PL diz que os crimes atribuídos a Ramagem pela PGR aconteceram depois que ele virou deputado. A data usada como parâmetro é o dia da diplomação dele: 19 de dezembro de 2022. “Todos os supostos crimes imputados a ele teriam sido consumados após a diplomação do deputado federal Alexandre Ramagem, porquanto o crime de organização criminosa armada, que possui natureza permanente, teria se estendido até janeiro de 2023, e os demais crimes imputados teriam ocorrido no dia 8 de janeiro de 2023”, justificou o partido no ofício.

Pedido do PL já tinha gerado reação no STF

Antes da votação do pedido do PL na comissão, o ministro Cristiano Zanin enviou um ofício ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Zanin, que é presidente da Primeira Turma do STF, disse a Motta que a suspensão só poderia atingir dois dos cinco crimes atribuídos a Ramagem: deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado.

O ministro esclareceu que os outros três crimes não podem ser suspensos pela Câmara. O entendimento do Judiciário é que eles aconteceram antes de Ramagem ser eleito deputado e ser diplomado. A avaliação é que ele participou da articulação pró-golpe enquanto era diretor da Abin.

A Câmara ignorou o ofício de Zanin.

Suspensão preocupa governistas

O parecer do relator Alfredo Gaspar favorável à sustação da ação penal preocupa deputados aliados ao PT. Eles apontaram que o relatório aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça — e pelo plenário da Câmara — possibilita a suspensão de toda a ação penal, e não somente dos crimes atribuídos a Ramagem. “O objetivo é beneficiar o Bolsonaro”, afirmou o deputado Rubens Pereira Jr. (PT-MA).

O projeto de resolução apresentado pelo relator não indicou que a análise se restringe a Ramagem. Ele foi votado com o seguinte texto: “Fica sustado o andamento da ação penal contida na petição 12.100, em curso no Supremo Tribunal Federal, em relação a todos os crimes imputados”, alegou Gaspar.