Assembleia de Minas

Zema pede urgência na adesão ao Regime de Recuperação Fiscal

Deputados estaduais terão 45 dias para analisar projeto enviado pelo Executivo

Por Gabriel Ferreira Borges
Publicado em 09 de outubro de 2021 | 05:00

A Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) tem 45 dias para apreciar o projeto de lei de adesão do Estado ao Regime de Responsabilidade Fiscal (RRF) da União.

O pedido de regime de urgência para a análise da matéria, protocolado pelo governador Romeu Zema (Novo) junto a um novo projeto substitutivo à matéria, foi lido em plenário na quarta-feira (6) a, quando o prazo começou a contar. 

Caso o prazo seja desrespeitado, o texto será diretamente incluído na ordem do dia. Entretanto, os deputados ainda não analisaram o último substitutivo anexado ao projeto. O governo estadual precisa dos votos de 39 dos 77 parlamentares para a aprovação da adesão ao RRF. 

O projeto de lei 1.202/2019 foi encaminhado pelo Palácio Tiradentes à ALMG em outubro de 2019, ainda no primeiro ano da gestão Zema. Desde então, sequer ou pelo crivo da Comissão de Constituição e Justiça, a primeira dos trâmites legislativos. 

Em março deste ano, o governo encaminhou à Casa um primeiro substitutivo à proposta. À época, foi para adequá-la à nova regulamentação do RRF sancionada dois meses antes. O novo substitutivo também segue alterações promovidas pelo governo federal nas diretrizes do programa.

O pagamento da dívida de Minas com a União está atualmente suspenso devido a liminares concedidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2018 e 2019. 

‘Risco de insolvência’

Inclusive, o principal argumento do governo Zema para a tramitação do projeto de lei em regime de urgência é a ameaça de queda das liminares no STF, já que estão condicionadas à adesão do Estado ao RRF. Em nota, o Executivo afirmou que o STF lhe intimou sobre a necessidade de ações concretas do Estado para a adesão ao regime.

“A iminência da queda da liminar coloca o Estado sob o risco de insolvência fiscal, uma vez que, caso isso ocorra, o Executivo estadual teria que desembolsar R$ 26 bilhões em um único pagamento. Essa situação comprometeria inclusive a manutenção da prestação de serviços de saúde, educação e segurança”, alega. 

Parcelas bilionárias

Além de desembolsar R$ 26 bilhões de uma só vez, o restante da dívida com a União – cerca de R$ 101 bilhões – teria que voltar a ser pago caso as liminares caiam. As parcelas seriam superiores a R$ 8 bilhões por ano.

“A adesão ao RRF promoveria um alívio imediato no fluxo das contas públicas, não apenas para manutenção dos pagamentos em dia, mas para a retomada de investimentos estruturados, uma vez que os pagamentos previstos para 2022 entre dívida e encargos chegam a R$ 13 bilhões.” 

De acordo com o último substitutivo, a adesão ao programa limitaria, por exemplo, o crescimento anual de despesas primárias do orçamento e da Seguridade Social ao índice anual do Índice de Preço Amplo ao Consumidor (IPCA), ou seja, uma espécie de “teto de gastos”. 

Além disso, permitiria a realização de leilões para quitar obrigações inscritas em restos a pagar ou então descumpridas. Dentre elas, precatórios vencidos até março de 2015 e dívidas com fornecedores e prestadores de serviço.

Por outro lado, o Estado seria autorizado a reduzir incentivos ou benefícios fiscais dos quais decorram renúncias de receitas de, no mínimo, 20%. O regime teria vigência de até nove anos. Na segunda-feira, Zema condicionou a concessão das duas parcelas finais do reajuste da segurança pública à adesão do Estado ao RRF.

Tema enfrenta resistência na Assembleia 

O líder do governo na Assembleia, deputado Gustavo Valadares (PSDB), endossa o posicionamento do Palácio Tiradentes ao atribuir o “timing” do pedido de regime de urgência para a tramitação do projeto à pressão do ministro Luis Roberto Barroso.

“O governo não teve outra alternativa senão encaminhar a urgência. O governo tem plena consciência de que quem resolverá se vamos aderir ou não ao RRF é a Assembleia. O governo fez a parte dele”, diz Valadares. Ele pontua que o regime de urgência é um instrumento previsto na Constituição para “tentar dar celeridade a projetos importantes”.

Embora afirme estar otimista com a tramitação, o tucano ite que a adesão será um desafio, já que Zema não tem base majoritária. “Será ou já é um grande desafio buscar o convencimento da maioria dos deputados sobre a importância da adesão ao RRF. Mas estou otimista frente a essa ‘ameaça’ da possibilidade de se revogar as liminares que permitem o não pagamento mensal da dívida. É um baita argumento”, diz.

‘Mais palatável’

Segundo Valadares, o substitutivo encaminhado na quarta-feira à Casa é mais “palatável” do que os anteriores. “Vários dos pré-requisitos que o texto trazia para o Estado e para os Poderes, como o congelamento de salário e a promoção de servidores, saíram do projeto”, avalia o tucano. 

Os votos de deputados do bloco independente são considerados chave para os planos do governo de aderir ao RRF. Contudo, conforme o deputado Cássio Soares (PSD), líder do bloco, a discussão sequer começou entre os parlamentares e não houve, até o momento, articulação do governo. 

“Ainda vamos levar aos deputados o que diz o projeto. Depois que fizer todas as reuniões com os membros com as informações precisas que vou ter condições de calcular os votos. É muito cedo para cravar”, diz Cássio. Ele acrescenta que a pauta está trancada devido a vários vetos de Zema, como aqueles à Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2022. Questionado sobre o regime de urgência, Cássio diz que recebeu com “naturalidade, considerando que é um instrumento legislativo”. 

Oposição.

Assim como Cássio, o líder do bloco de oposição, deputado André Quintão (PT), aponta o regime de urgência como prerrogativa de Zema. Entretanto, Quintão pondera que a oposição tem restrições à adesão e às condicionantes do processo. 

“O RRF, em um momento em que é preciso diminuir a desigualdade social, reforçar o o às condições igualitárias de educação em meio à pandemia, não é adequado. As condições vão limitar os investimentos do Estado. O RRF impede a ampliação da rede de apoio e investimentos públicos”, avalia o petista. 

Quintão acredita que o Governo terá dificuldades na ALMG devido aos impactos no funcionalismo público e nos demais Poderes. “Até que ponto os outros Poderes estão envolvidos?”

O líder da oposição ainda questiona o porquê Zema não propôs, por exemplo, a rediscussão da Lei Kandir - Lei 87/1996, que disciplina a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Conforme Quintão, as perdas de Minas com a Lei Kandir seriam superiores à dívida do Estado com a União. “O Governo deveria rediscutir a Lei Kandir, não aceitar imposições do Governo federal”, afirma.

Após acordo firmado entre União e Estados em 2020, o Executivo pagará aos entes R$ 58 bilhões até 2037 - Minas, por exemplo, receberá R$ 8,7 bilhões, sendo R$ 6,5 bilhões destinados ao Governo estadual.