ROMPIMENTO DE BARRAGEM

Acordo de Mariana x ação em Londres: entenda a diferença para municípios atingidos

Prefeituras de cidades afetadas pela tragédia em novembro de 2015 tem até 6 de março para escolherem entre a repactuação no Brasil ou a ação na justiça inglesa

Por Maria Clara Lacerda
Atualizado em 18 de fevereiro de 2025 | 21:26

Quase 10 anos após o rompimento da barragem do Fundão, que matou 19 pessoas e afetou permanentemente a Bacia do Rio Doce a partir de Mariana, no Centro de Minas Gerais, 49 cidades afetadas pela tragédia precisam escolher entre duas opções de compensação pelos danos sofridos. A prefeitura das cidades tem, oficialmente, até 6 de março para escolher entre o acordo de repactuação coordenado pelo governo federal, o de Minas e o Ministério Público, ou a ação movida na corte de Londres, na Inglaterra, ainda sem julgamento definido. 

No julgamento baseado na justiça inglesa, o valor quantificado através das perdas que os municípios tiveram com o rompimento da barragem é de £ 7,2 bilhões (cerca de R$ 52 bilhões) — o valor seria distribuído entre todos os municípios na ação, de forma proporcional ao impacto sofrido em cada cidade. Já na repactuação proposta no Brasil, em acordo com a Samarco, os municípios que participarem da medida receberão, ao todo, R$ 6,1 bilhões parcelados em 20 anos.

Nesta terça-feira (18 de fevereiro), 23 municípios que fazem parte do Consórcio Público de Defesa e Revitalização do Rio Doce (Coridoce) se reuniram para criticar os termos atuais do acordo de Mariana e demandar uma mudança de valores e tempo de pagamento para que aceitem participar da repactuação no Brasil. O grupo vê como outra opção o prosseguimento na ação na justiça inglesa, cujo julgamento é previsto para o fim do primeiro semestre deste ano e pode garantir um valor quase nove vezes maior do que o previsto pela repactuação.

“O valor (da ação em Londres) é muito maior do que foi ofertado na repactuação. É uma decisão de cada prefeito ver o que é melhor para cada município”, declarou o prefeito de Sem Peixe, Éder de Tiquim (PSD), atual presidente do Coridoce. O movimento de prefeitos de Minas Gerais e do Espírito Santo tenta mudar os termos relacionados ao pagamento da compensação, considerado irrisório pelos chefes de Executivo e por seus representantes, conforme discutido nesta manhã. 

“A maioria dos prefeitos não querem para melhorar o acordo final quanto aos municípios”, afirmou o prefeito de Mariana, Juliano Duarte (PSB), que recebeu os mandatários dos outros municípios nesta manhã. Segundo relatado pelo grupo de prefeitos, o maior problema nos termos da repactuação realizada entre o governo e a Samarco está na falta de atenção às demandas dos municípios. Os chefes do Executivo justificam que, nos moldes atuais, a repactuação agrada apenas a União e o governo de Minas Gerais, mas se esquece dos problemas enfrentados pelas prefeituras, mesmo quase 10 anos após a tragédia. 

“Da forma como está, os termos que foram acordados sem a presença e sem a anuência das prefeituras, nenhum dos presentes vai a repactuação no Brasil. Ele é inviável, é ruim, é um desrespeito para as prefeituras desde Mariana até o Espírito Santo. Nós estamos falando de um valor global de R$ 170 bilhões, desde a constituição da Fundação Renova até a do acordo. Desse valor total, apenas 4% ficou com todas as cidades que foram atingidas diretamente pelo rompimento da barragem”, enfatizou o chefe do Executivo de Mariana. Duarte também criticou o tempo de pagamento, que pode chegar a 29 anos. “Foram nove anos para a e outros 20 para que o valor seja pago em parcelas anuais para todas as prefeituras. Esse valor ainda é depositado em um banco e reajustado com a inflação. No fim, um valor que já é irrisório, vai ser melhor ainda para os municípios”, apontou. 

Para os prefeitos, a ação na justiça inglesa parece ser a forma mais viável de conseguir valores considerados justos. O grupo deve encaminhar ainda nesta terça-feira o documento assinado com demandas de alterações no acordo, diretamente para a Samarco. “Caso contrário, vamos lutar pelos nossos direitos fora do país, já que não fomos ouvidos no Brasil”, encerrou o prefeito de Mariana. Segundo o mandatário, a expectativa quando ao julgamento na Inglaterra é que, caso o veredito seja favorável, a cidade receba cerca de R$ 28 bilhões.

A Samarco informa que 12 municípios já aderiram ao acordo e afirma, em nota, que "segue em diálogo com os demais municípios para viabilizar novos rees e assegurar uma reparação definitiva dos danos provocados pelo rompimento".

Leia a nota na íntegra

Sobre a Fundação Renova

"Conforme previsto no Acordo de Reparação da Bacia do Rio Doce, a Fundação Renova está extinta e em fase de liquidação. A transição de ações para a Samarco será realizada em até 12 meses contados a partir da homologação do acordo, em novembro de 2024.

Ações voltadas para a saúde, educação, saneamento ambiental, programa de transferência de renda, entre outras, serão implementadas pelo poder público nos territórios atingidos e para a sociedade em geral. Para isso, serão transferidos R$100 bilhões pela Samarco para os governos federal, estadual de Minas Gerais e Espírito Santo, e municípios que aderirem ao acordo

As ações ligadas às indenizações, reassentamentos e recuperação ambiental da bacia do Rio Doce foram assumidas pela Samarco. A empresa ressalta que durante o período de transição não haverá qualquer interrupção nos canais de diálogo atualmente existentes."

Sobre as adesões ao Acordo

"A Samarco informa que 12 municípios já aderiram ao Acordo de Reparação. Para os municípios que formalizaram a adesão nos primeiros 20 dias após a homologação, foi realizado em dezembro ree que somou R$ 26,8 milhões. Após esse período, os desembolsos serão realizados conforme os prazos estipulados no acordo. Os recursos são voltados à reparação e a iniciativas de fortalecimento ambiental e socioeconômico nas cidades atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão.

O prazo para adesão vai até 06 de março de 2025. Em Minas Gerais, aderiram os municípios de Ponte Nova, Iapu, Santana do Paraíso, Marliéria, Córrego Novo e Sobrália. No Espírito Santo, Anchieta, Fundão, Serra, Linhares, Conceição da Barra e São Mateus.

Ao todo, 49 municípios em Minas Gerais e no Espírito Santo são elegíveis ao acordo. O acordo, homologado por unanimidade pelo Supremo Tribunal Federal em 06 de novembro de 2024, foi assinado pela Samarco, suas acionistas, União, Governos de Minas Gerais e do Espírito Santo, Ministérios Públicos Federal e Estaduais e Defensorias Públicas da União e Estaduais (MG e ES), entre outros órgãos públicos.

A Samarco segue em diálogo com os demais municípios para viabilizar novos rees e assegurar uma reparação definitiva dos danos provocados pelo rompimento."