Poder, república e corrupção
Instituições enfraquecidas e desconfiança da democracia
República: forma de governo em que o Estado prioriza o interesse do povo, sendo a própria população responsável pela eleição de um chefe de Estado que governará por um período limitado. O termo deriva do latim “res publica”, que significa “assunto público”. São definições clássicas. Alguns países avançados, como Reino Unido, Espanha, Suécia e Japão, ainda organizam suas democracias por meio de monarquias constitucionais. O rei encarna o Estado, e o Parlamento traduz o governo nascido da vontade popular. Independentemente da configuração do sistema, volta e meia a democracia é confrontada por líderes de viés autoritário ou por ditadores abertos.
A democracia necessita de legitimação permanente pelo voto, pela participação social e pelo desempenho eficaz na economia e na entrega de serviços públicos de qualidade. Quando a população percebe que a dinâmica democrática não está produzindo resultados, as instituições democráticas se enfraquecem.
Um dos principais vetores da crise da democracia contemporânea é a corrupção entranhada nas instituições. Ouçamos o austero ex-presidente do Uruguai José Mujica, pessoa carismática, nutrida por rara sabedoria e que cultivou sempre hábitos simples: “Se misturamos a vontade de ter dinheiro com a política, estamos fritos. Quem gosta muito de dinheiro tem que ser tirado da política. É preciso castigar essa pessoa porque ela gosta de dinheiro? Não. Ela tem que ir para o comércio, para a indústria, para onde se multiplica a riqueza”.
Trajetória histórica
Quando saí do movimento estudantil para entrar na vida pública, nos idos de 1982, alguns conceitos eram muito caros: liturgia nos cargos, austeridade pessoal, honestidade, espírito público e sentimento republicano, independentemente de correntes políticas. Os líderes da redemocratização, Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, eram símbolos desses valores. Não há uma mancha em suas trajetórias.
No Império, a democracia brasileira abraçava apenas as elites. A Velha República é identificada como um Estado essencialmente patrimonialista. Na República Nova, as denúncias de corrupção foram permanentes. Durante o regime militar, apesar da ausência de liberdades, houve permanentes denúncias de corrupção.
A Nova República despertou, há 40 anos, esperanças de que a república encontraria a afirmação de sua essência. No entanto, enfrentamos escândalos recorrentes.
Agora, na era pós-Lava Jato, que teve parte de suas decisões anuladas pelo STF por erros processuais, e não por julgamento de mérito, várias denúncias e suspeitas abalam a confiança da população nas instituições republicanas. E aí se envolvem todos os Poderes e matizes ideológicos.
Desconfiança dos cidadãos
O presidente Collor, afastado por corrupção, mas inocentado pelo Judiciário, é preso, décadas depois, por reincidência na corrupção. O INSS é mergulhado num mar de corrupção. Denúncias são apuradas por más práticas de alguns parlamentares com suas emendas. Relações incestuosas entre interesses privados e públicos vêm à tona em relação a membros do Judiciário. A população olha tudo isso “bestializada” e com grande desconfiança e pessimismo.
O humorista brasileiro Stanislaw Ponte Preta cunhou uma frase irônica certa vez: “Restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos”. Não é certamente o caso. A democracia brasileira exige o restabelecimento radical da ética republicana