Zema: ao peso da caneta, responderemos dançando
Reação ao cancelamento do espetáculo ‘M.a.n.i.f.e.s.t.a.’
Estamos vivendo grandes mudanças e uma retomada do nosso país, mas Minas Gerais, apesar das várias vitórias no Legislativo, ainda parece patinar na contramão da democracia e da garantia de direitos. Infelizmente tivemos mais um episódio de ataque direto à cultura do nosso Estado e isso traz à tona a lembrança de práticas que pareciam ter ficado em um ado próximo. Culturicídio.
Após exonerar o diretor artístico da Companhia de Dança do Palácio das Artes (DA), Cristiano Reis, e outros integrantes do grupo, o governador Romeu Zema cancelou a exibição do espetáculo “M.a.n.i.f.e.s.t.a”, com reestreia prevista para 15 de março. A alegação da Fundação Clóvis Salgado é de que o espetáculo já havia cumprido a sua meta no ano ado.
"o atrás"
O espetáculo usa a dança para uma defesa da democracia e para apontar os riscos de governos autoritários. Essa pauta incomoda os que regem a tal cartilha do autoritarismo. Seria esse o caso do nosso atual governador? A frase que justificou o cancelamento da temporada de “M.a.n.i.f.e.s.t.a.” foi de que é preciso dar um o atrás. Que o seria esse? É tempo de avanço, da volta do Ministério da Cultura, é tempo de olhar para as nossas tradicionalidades. É tempo de arte e de liberdade. Não nos cabe mais, em 2023, os atrás.
Episódios como esse nos fazem olhar para a história. Irônico pensar que justamente em governos autoritários e violentos, a arte, assim como os povos indígenas, comunidades tradicionais e os que ousam outras formas de expressão e vivência, são sempre os alvos número um, e que é exatamente desse debate que os mineiros estão sendo privados. Ou seria essa a intenção?
Radio Inconfidência e Rede Minas
Não é a primeira vez que a cultura em Minas é atacada pela atual gestão. Desmonte da Rádio Inconfidência e da Rede Minas, falta de diálogo com o setor, editais que mais parecem publicidade do que incentivo à cultura. Poderia listar infinitos problemas, mas o ponto agora é que essas práticas não se alinham com a vontade do povo brasileiro e com Estado Democrático de Direito. Reintegramos posse do nosso país com nossos maracás, com os tambores do povo negro, com uma nova fotografia de Brasil e com nossos corpos em dança.
É importante lembrar também que a prática autoritária aparece em outras áreas, como na defesa da mineração desenfreada, na ânsia pela privatização do nosso Estado, na falta de participação popular. É uma prática obsoleta, sinto informar. Aos que destroem, nos resta lembrá-los de que a destruição chega para todos e todas, mesmo que para alguns privilegiados demore mais. Se a arte incomoda, imagina o veneno na sua mesa, a falta de água e as tragédias ambientais.
Cultura e humanidade
Se falamos que não há planeta B e que sem o meio ambiente não há humanidade, reitero que sem arte e cultura também não haverá. Ou melhor, que na tentativa de acabar com a nossa humanidade, é sempre ela, a cultura, que nos retorna a ela. É sempre a arte e as nossas tradições que nos levam de volta a um caminho do futuro.
Volto a pensar sobre o culturicídio. É uma tarefa árdua tentar extinguir a arte e a cultura. Muitos tentaram, ouso dizer que ninguém conseguiu. Quando nos tornamos alvo, sempre lembramos que também somos flecha e é com a força da flecha que a cultura retorna, sempre mais viva, voraz e irreverente. “Cala a boca” nenhum jamais conseguiu surtir efeito duradouro. A nossa essência é justamente criar formas de se expressar. Aos que não sabem como inventar linguagens, o peso da caneta parece a única saída. Responderemos sempre com poesia, com mais arte, com nossos corpos, cocares e maracás. Dançaremos sempre.