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Ex-diretor da Cia. de Dança Palácio das Artes sobre exoneração: 'Desumana'
Cristiano Reis lamenta a maneira como se deu seu desligamento da Fundação Clóvis Salgado e fala sobre o cancelamento do espetáculo 'm.a.n.i.f.e.s.t.a.'; FCS diz que medida atendeu a uma 'necessidade de reorganização e reestruturação istrativa'

“Não foi bem uma surpresa. Entendi que estava tendo uma condução mais tradicional, um pensamento de dança e de produção de arte mais retrógrado aparecendo nas entrelinhas, habitando o nosso fazer”, afirma Cristiano Reis em entrevista por telefone a O TEMPO. Reis foi exonerado do cargo de diretor artístico da Cia. de Dança Palácio das Artes, um dos três corpos artísticos mantidos pela Fundação Clóvis Salgado, ao lado do Coral Lírico de Minas Gerais e da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais.
A exoneração – outros colaboradores que ocupavam cargos comissionados também foram exonerados – não foi exatamente uma surpresa para Reis, mas a forma como se deu o desligamento é vista por ele como “violenta e desumana”. O pesquisador, bailarino e diretor tem uma longa trajetória na Cia. de Dança Palácio das Artes. Ele entrou na instituição como bailarino em 2000 e ocupava a direção artística desde 2015 – em março, completaria nove anos no cargo. Cristiano Reis foi demitido em uma chamada de vídeo com a justificativa de que seu currículo não havia sido aprovado pelo governo do Estado.
“Foi uma violência, um desrespeito desumano. Sem partidarizar, me interessa como as coisas são feitas. Ninguém merece isso. ei muitos anos da minha vida ali, me dedicando, trabalhando muito com poucos recursos. Tenho orgulho da minha trajetória na Cia. de Dança”, diz o bailarino. Ainda segundo o artista, ele ouviu comentários de que pessoas ligadas à gestão do governador Romeu Zema estariam analisando as redes sociais de servidores com o objetivo de flagrar possíveis ataques ao governo.
A exoneração de Cristiano Reis aconteceu uma semana antes de outra notícia – essa, sim, lhe causaria maior espanto. O espetáculo “m.a.n.i.f.e.s.t.a.”, estreado em novembro do ano ado para celebrar os 50 anos da Cia. de Dança Palácio das Artes e o centenário do movimento modernista no Brasil, cujo marco inicial é a Semana de Arte Moderna de 1922, realizada em fevereiro daquele ano em São Paulo, não seria mais reapresentado em 15 de março, como previa o contrato.
Segundo Cristiano Reis, tal decisão também tem a ver com um novo pensamento artístico que habita a Fundação Clóvis Salgado. No entanto, o fato de “m.a.n.i.f.e.s.t.a.”, num primeiro momento, ter tido aval institucional, mas agora ar a ter sua exibição cancelada, intriga o pesquisador: “Achei bastante estranho. Um projeto maravilhoso simplesmente jogado no lixo? O que vai ser colocado no lugar? Sou uma pessoa de pensamento contemporâneo, mas dialogo com o tradicional, não sou contra o clássico, muito pelo contrário. Eles nos ensinam bastante, mas acho que deve haver uma atualização do pensamento até para fazer arte erudita. Tenho uma trajetória que preza pela multilinguagem”.
Criação coletiva, “m.a.n.i.f.e.s.t.a.”, inspirado nos manifestos “Pau Brasil” e “Antropófago”, de Oswald de Andrade, leva ao palco o testemunho corporal de 17 bailarinos e bailarinas, incentivados pelas diretoras Marise Dinis e Kenia Dias a colocarem – primeiramente em forma de texto – no palco suas referências e angústias estéticas, políticas e existenciais.
Marise Dinis recebeu a notícia da paralisação do projeto com espanto. Ela diz que a reapresentação de “m.a.n.i.f.e.s.t.a.” era muito aguardada em função do sucesso e da repercussão extremamente positiva após a estreia no Palácio das Artes. “É de praxe que a companhia reprise seus espetáculos. A conversa é que a gente retrabalharia o projeto e apresentaria em 15 de março. Isso foi acertado, eu já estava com o contrato assinado, mas me ligaram para cancelá-lo”, conta.
“Fica a minha pergunta: por que algo que levantou tanto interesse, que teve uma repercussão tão incrível, foi cancelado? Para mim, é uma afronta à Cia. de Dança Palácio das Artes, que lutou e luta muito para sobreviver e se manter”, completa Marise.
Clima de incerteza e críticas ao governo Zema
A notícia da exoneração de Cristiano Reis e do cancelamento de “m.a.n.i.f.e.s.t.a.” em 2023 não foi bem recebido pelo meio cultural de Minas Gerais. A bailarina Mariângela Caramati tem 40 anos de carreira e 35 de Cia. de Dança Palácio das Artes. Ela ainda se emociona ao lembrar que, ao fim de “m.a.n.i.f.e.s.t.a.”, um teatro lotado aplaudiu a performance “por mais de três minutos, todos de pé”. Por isso, saber do cancelamento do espetáculo lhe causa revolta e tristeza.
“Olha, eu falo por mim, mas isso tem a ver com um desmonte, inclusive artístico, e com a ideia de que os corpos artísticos estão a serviço de um governo. Nosso projeto artístico sempre foi muito respeitado, mas na gestão Zema as coisas mudaram bastante. Talvez a linha de trabalho e o perfil artístico que a gente desenvolve não seja do interesse desse governo”, sublinha a artista.
Mariângela Caramati também critica o que ela chama de falta de diálogo e de transparência sobre as recentes decisões: “Isso me incomoda bastante, fica no ar se é censura, ninguém responde. Vejo um sucateamento não só da Cia. de Dança, mas da Fundação Clóvis Salgado como um todo. Os artistas deveriam ser mais ouvidos e respeitados. Agora, estamos sem direção”. Sobre a exoneração de Cristiano Reis, Mariângela chama a definição de “antiética”. “A forma como ele foi tirado, sem nenhum diálogo, me parece muito arbitrária. Isso não me desce, nunca fomos tratados assim, istrativamente. Somos artistas”, acrescenta a bailarina.
De acordo com a Fundação Clóvis Salgado, o nome do novo diretor artístico da Cia. de Dança Palácio das Artes será anunciado em breve. Na próxima segunda-feira (6), às 14h, no Palácio das Artes, a instituição irá divulgar a programação de 2023.
A bailarina Ana Paula Oliveira, ex-integrante do Grupo Corpo e da Cia. de Dança Palácio das Artes, usou a hashtag #ZemaInimigodaCultura em seu perfil no Facebook para repercutir a exoneração de Reis e o cancelamento da nova exibição de “m.a.n.i.f.e.s.t.a.”. Para ela, o espetáculo nasce do “solo fértil de uma Cia de Dança estatal, impregnada de luta e resistência” e é “resultado de um trabalho artístico que vem sendo construído ao longo de praticamente ¼ de século”.
“O espetáculo foi ovacionado pela plateia de pé por minutos a fio de forma arrebatadora – acredito que tenha sido a temporada de maior sucesso ao longo da trajetória da Cia. (...) Acredito na importância de ressaltar o tom de alerta ao perigo que o importante patrimônio artístico cultural de MG, constituído pela CDPA/FCS, se encontra”, escreveu Ana Paula Oliveira.
O que diz a Fundação Clóvis Salgado
Em nota enviada a O TEMPO, a Fundação Clóvis Salgado se manifesta sobre a exoneração de Cristiano Reis e diz que o desligamento do ex-diretor artístico da Cia. de Dança Palácio das Artes “leva em consideração a necessidade de reorganização e reestruturação istrativa, com vista à racionalização do uso dos recursos públicos e promoção do aumento da produtividade dos servidores que integram o Grupo de Direção e Assessoramento da istração direta e indireta do Poder Executivo.”
Sobre “m.a.n.i.f.e.s.t.a.”, a nota ressalta que o espetáculo ou a fazer parte do repertório da Cia. de Dança Palácio das Artes “e, a qualquer momento, havendo disponibilidade de novos recursos orçamentários e financeiros, poderá ser remontado em Belo Horizonte ou em outro local dentro ou fora do Estado”.
Segundo a Fundação Clóvis Salgado, “m.a.n.i.f.e.s.t.a.” é furto de um contrato firmado em dezembro de 2021 entre a FCS e Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), e “e previa, em seu plano de trabalho, duas apresentações, que foram cumpridas em 5 e 6 de novembro, com público total de 1.660 pessoas, sendo 879 espectadores no dia 5/11 e outros 781, em 6/11”.
Por fim, o comunicado enviado à reportagem afirma que a Cia. de Dança Palácio das Artes se prepara para estrear, ainda neste primeiro semestre, um espetáculo dirigido por Tuca Pinheiro e inspirado no Vale do Jequitinhonha. Na próxima segunda-feira (6), às 14h, no foyer do Grande Teatro do Palácio das Artes, a programação de 2023 da instituição será anunciada.
O governo de Minas também foi procurado por O TEMPO, mas até a publicação desta matéria não havia se manifestado.
Atualização
Às 19h09 de terça-feira (28), o governo de Minas Gerais, por meio do Núcleo de Atendimento à Imprensa, respondeu a demanda de O TEMPO enviada por e-mail no dia anterior, às 16h06, limitando-se a replicar a nota já encaminhada à reportagem pela Fundação Clóvis Salgado.
Confira a nota da Fundação Clóvis Salgado na íntegra:
“O espetáculo '.m.a.n.i.f.e.s.t.a.', da Cia. de Dança Palácio das Artes, é fruto do contrato 098/2021, firmando em 27 de dezembro de 2021, entre a Fundação Clóvis Salgado (FCS) e o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), para execução das ações em comemoração dos 100 Anos da Semana de Arte Moderna, que ocorreu ano ado.
O contrato supracitado previa, em seu plano de trabalho, duas apresentações do “.m.a.n.i.f.e.s.t.a.”, que foram cumpridas em 5 e 6 de novembro, com público total de 1.660 pessoas, sendo 879 espectadores no dia 5/11 e outros 781, em 6/11. Desde então, o espetáculo ou a fazer parte do repertório da Cia. de Dança Palácio das Artes e, a qualquer momento, havendo disponibilidade de novos recursos orçamentários e financeiros, poderá ser remontado pela Cia. de Dança Palácio das Artes, seja em Belo Horizonte ou em outro local dentro ou fora do Estado.
Neste momento, o grupo se prepara para, sob a direção de Tuca Pinheiro, realizar um novo espetáculo, inspirado no Vale do Jequitinhonha, previsto para estrear ainda no primeiro semestre. Já no dia 6 de março próximo, às 14h, no foyer do Grande Teatro CEMIG Palácio das Artes, será anunciada a nova programação de toda instituição.
A Fundação Clóvis Salgado esclarece, ainda, que a Cia. de Dança Palácio das Artes está completa, e todos os bailarinos estão trabalhando em prol da nova programação da instituição. As exonerações dos servidores de Recrutamento Amplo, ocorridas em todas as pastas, em janeiro, levam em consideração a necessidade de reorganização e reestruturação istrativa, com vista à racionalização do uso dos recursos públicos e promoção do aumento da produtividade dos servidores que integram o Grupo de Direção e Assessoramento da istração direta e indireta do Poder Executivo."