INSATISFAÇÃO

Federações partidárias vivem crise e pensam em rompimento

Líderes alegam que saldo das eleições de 2024 ficou muito abaixo do esperado

Por Hermano Chiodi
Publicado em 02 de dezembro de 2024 | 06:00

Criado há apenas três anos, o modelo das federações partidárias já dá sinais de crise e divide opiniões entre líderes políticos. Quem está fora ainda pensa em entrar, mas algumas legendas que aderiram ao modelo já pensam em romper alianças antes de completar os quatro anos mínimos previstos pela Justiça.

As federações foram criadas em 2021 para substituir as coligações entre partidos que existiam nas eleições para Casas legislativas. No Brasil, são três federações, e em todas são comuns relatos que indicam insatisfação. Mas a legislação prevê punições para quem deixar a federação de forma antecipada, e isso ainda impede o rompimento precoce.

Os partidos insatisfeitos buscam alternativas, mas, na prática, já atuam de forma autônoma em relação às siglas federadas. Os argumentos apresentados pelos líderes contra as federações são vários. O fundamental, no entanto, é o resultado nas eleições municipais deste ano, considerado abaixo das expectativas.

Avaliando os resultados nacionais dos sete partidos vinculados a alguma federação, apenas o PT viu sua votação legislativa aumentar entre 2020, última eleição antes da criação das federações, e 2024, eleição mais recente. Os demais – PV, PCdoB, PSDB, Cidadania, Rede e PSOL – registraram queda no número de votos para as Câmaras Municipais. A redução chegou a quase 60% no caso do Cidadania, que havia tido cerca de 3 milhões de votos para vereador em 2020 e caiu para 1 milhão neste ano.

Alguns dos entrevistados preferiram não se identificar para evitar atritos com colegas da federação. Mas entre a maioria a impressão é que a experiência foi ruim. “Os partidos menores ficam muito subordinados e espremidos em suas atuações. Não têm voz”, destaca um dos líderes de uma federação partidária em Minas ouvido por O TEMPO. A reclamação foi a principal entre os partidos com menos espaço dentro das federações.

O PV, por exemplo, que integra uma aliança com PT e PCdoB, já manifestou não ter gostado da experiência. A deputada estadual Lohanna (PV) reclamou publicamente dos rumos da federação. No entanto, ela se limitou a pedir um “fim tranquilo” da relação.

“Se o fim da federação de fato acontecer, que é o que parece que está muito desenhado, que seja um processo respeitoso, democrático e tranquilo”, disse a parlamentar. A posição foi reafirmada pelo presidente do Partido Verde em Minas Gerais, Osvander Valadão. No Estado, a votação da legenda caiu 41% entre uma eleição municipal e a outra.

Há, no entanto, quem defenda a continuidade. O representante do PCdoB em Minas, Richard Ferreira Romano, segue neste caminho. “A nossa avaliação é que a experiência representou um avanço significativo. Temos a opinião de que deve-se permanecer e ainda com a possibilidade de ampliação”, diz Romano.

O presidente do PT em Minas, deputado estadual Cristiano Silveira, afirma que o PT ainda não tem uma definição oficial sobre a continuidade da federação e que o tema será discutido em uma reunião do diretório nacional. Contudo, parlamentares da legenda dizem que estão insatisfeitos. “O PT não ganhou nada com a federação”, afirma um deputado ouvido pela reportagem.

Desavenças internas

Na federação PSOL-Rede, as reclamações são dos dois lados. Durante a campanha deste ano na capital mineira, as dificuldades em adotar um caminho comum sobressaíram. Enquanto o PSOL indicou a deputada estadual Bella Gonçalves para ser vice do petista Rogério Correia na corrida pela prefeitura, o porta-voz da Rede em Minas, o ex-deputado Paulo Lamac, participou ativamente da campanha para a reeleição do prefeito Fuad Noman (PSD).

A federação que uniu PSDB-Cidadania teve seu auge de incompatibilidade em Minas Gerais ainda nas eleições de 2022, a primeira disputada com o modelo de federação. Na ocasião, o PSDB vetou aliança do Cidadania com o governador Romeu Zema (Novo), que estava disposto a oferecer o cargo de vice-governador em sua chapa para a legenda, e decidiu lançar uma candidatura própria, encabeçada à época pelo ex-deputado Marcus Pestana.

Aliança é necessária para o a verba

A necessidade de sobrevivência dos partidos sem o ao Fundo Eleitoral pode ser o combustível para que as federações continuem mesmo diante da insatisfação de algumas legendas. A opinião é do deputado federal e ex-governador de Minas Aécio Neves (PSDB), autor da PEC que levou à criação das “cláusulas de barreira”, que limitam o o a recursos públicos pelos partidos políticos.

O parlamentar prevê que o número de partidos políticos, atualmente em 29, se torne 20 dentro de alguns anos. Na avaliação do parlamentar, as federações foram criadas justamente com esse objetivo. “Esses partidos vão ter que buscar a federação no futuro, mais adiante. Serão necessárias as incorporações ou fusões para que (os partidos) tenham sobrevivência. Esse foi, vamos dizer, o sentido dessa lei da federação”, diz o tucano.

A regra, aprovada na Emenda Constitucional 90/2017, prevê que só terão direito aos recursos do Fundo Eleitoral aqueles partidos ou federações que tiverem no mínimo 3% da votação nacional, distribuída em pelo menos um terço dos Estados, ou aqueles que elegerem pelo menos 15 deputados federais, distribuídos por um terço dos Estados.

Pelo menos uma quarta federação está sendo debatida no Brasil. O PSB, do qual faz parte o vice-presidente Geraldo Alckmin, já tem o aval da direção do partido para avaliar uma união com o PDT, do ex-governador cearense e ex-candidato a presidente Ciro Gomes (PDT). A reportagem entrou em contato com a direção das legendas em Minas para verificar como elas avaliam os impactos da união no contexto mineiro, mas não obteve retorno.

Sem modelo, ‘pequenos’ correm risco

Entre os defensores do modelo de federação partidária estão parlamentares de legendas maiores que poderiam incorporar as menores para engrossar o quociente eleitoral, o número mínimo de votos para conquistar cadeiras em Câmaras e Assembleias.

“Para as eleições de deputados, os resultados têm sido importantes para a montagem das chapas. Sozinhos, muitos partidos menores não conseguem se viabilizar, correndo risco de extinção”, afirma o líder de uma dessas grandes legendas.

Para esses defensores, a dificuldade de continuidade das federações não está no modelo adotado no Brasil, mas na cultura dos líderes políticos. “O histórico de partidos no Brasil é feito de ‘coronéis’, verdadeiros donos de partidos, que não querem abrir mão de seus espaços, mesmo quando não conseguem sobreviver sozinhos”, diz um parlamentar.