A saga motorizada do tio Paulo
O desejo de dirigir pode surgir na vida em qualquer idade, e foi isso que aconteceu
Esta história aconteceu há muitos anos. É verídica. E o protagonista é um tio muito querido que nos deixou há muitos anos Com ele convivi alguns bons anos de minha adolescência e sempre com uma doce saudade que relembro o caso do tio Paulo, também meu padrinho.
Vida nova
Tudo começa depois que o tio Paulo é submetido - com sucesso - a uma cirurgia delicada. Ele, já na casa dos sessenta anos e sem nunca ter ligado para automóvel, resolve repaginar sua vida - a partir de então - através das quatro rodas.
A escolha
Solteiro e bem de vida, tio Paulo logo começa logo a se interessar pela aquisição de seu primeiro carro. Teria de ser zero quilometro, na cor bordô. Um anúncio em uma revista ajudou-o a se decidir pelo modelo.
Corcel II
Escolheu o então recém-lançado Corcel II. Tio Paulo, em um "carro de praça", como ele se referia aos táxis, até então seu meio de transporte oficial, dirigiu-se a uma concessionária Ford da cidade.
Na revenda
Lá chegando e sem nunca na vida ter entrado em uma revenda, foi logo reconhecido - talvez pelo semblante de quem esteja perdido - por um atencioso vendedor. Seguiu-se, então, o diálogo:
Tem mas acabou
Você tem o Corcel II para vender? Claro. Um excelente lançamento da Ford! Vou levar um. Na cor bordô. Pago a vista. Que bom! Mas na cor que o senhor quer não temos neste momento.
Espero meia hora
Terá que esperar um pouco. Aí, segundo relato de um amigo que o acompanhava na incursão à revenda, tio Paulo se sentou em um sofá e decido disse. Está bem, espero meia hora. Esperou um pouco mais e foi convencido a mudar sua cor preferida.
Nova cor
No dia seguinte ele volta (com um amigo que iria dirigir o carro) para buscar o Corcel II. Verde metálico. LDO, com interior monocromático, como o próprio tio Paulo nos contou.
Equipa
Da revenda a uma loja de órios foi um pulo. Saiu de dentro de seu reluzente Corcel II, estalando de novo, chamou um vendedor, lhe entregou-lhe chave do bólido e disse a palavra mágica: equipa.
Árvore de Natal
O cara não acreditou. Pôs no carro de rodas de magnésio a um som de boate. ando por um completo conjunto de faróis auxiliares que, os, chegava a fazer inveja aos holofotes da CEMIG.
Em buscada CNH
O o seguinte - nada fácil - foi tirar a carteira de habilitação. Sem nenhuma experiência foi preciso de muitas horas de aula particular. Finalmente, uns três meses depois, e com exames prestados pela banca examinadora do Detran, em Araxá, tio Paulo se habilita e a a exercer seu direito de ir e vir motorizado.
Fazendo pista
Era tudo que ele queria. Carro novo, carteira de motorista no bolso, saúde em dia e dinheiro para gastar, só lhe faltava à experiência ao volante. "Amanhã acordo cedo para fazer pista".
Década de 80
Era o que dizia explicando seu treinamento diário para ganhar a prática necessária para enfrentar o trânsito de Belo Horizonte, já conturbado nos idos do começo da década de 80, época de nossa história.
Sem retorno
Certa feita, fazendo "pista", tio Paulo seguiu pela Avenida Raja Gabaglia, clareando o dia, em direção ao BH Shopping. Já saiu de casa pensando como faria para retornar e tomar o caminho de volta. Como já havia ido, como ageiro, várias vezes ao centro de compras, que estava sendo inaugurado, achou que não teria problemas em fazer o balão no estacionamento.
Sufoco
Mas teve. Ele não conseguiu achar a entrada e continuou dirigindo até quase Nova Lima, para então pedir ajuda e conseguir ar para o outro lado da rodovia. Esta é apenas uma das muitas histórias envolvendo o saudoso tio Paulo, um sessentão boa praça, torcedor do cruzeiro e que curtiu os últimos cinco anos de sua vida se divertindo (e se perdendo) a bordo de seu Corcel II, verde metálico. Todo equipado...