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CONFIANÇA

Márcio de Lima, presidente da Anfavea, calcula R$ 180 bilhões de investimentos do setor automotivo

A Anfavea é a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores que representa 26 montadoras com 53 unidades industriais no Brasil

Anfavea lidera setor de R$ 180 bilhões de investimentos em 5 anos

Por Helenice Laguardia
Publicado em 08 de março de 2025 | 16:02

Márcio de Lima Leite, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) é o quinto entrevistado da Temporada Minas S/A Mercados em todas as plataformas de O Tempo.

A entidade foi fundada em 1956 e representa um setor – 26 montadoras, 53 unidades industriais em nove Estados e 38 municípios – que vive o maior ciclo de investimentos da história num total de R$ 180 bilhões em investimentos para os próximos cinco anos. “Só que esse número vai aumentar”, conta o executivo. 

A Anfavea reúne as empresas fabricantes de automóveis, comerciais leves, caminhões, ônibus, máquinas agrícolas e de construção.

No histórico de vendas de veículos, Márcio crava: “o Brasil não é elétrico, é eclético. Nós vamos ter todas as tecnologias no Brasil, nós vamos chegar em 2035 com mais ou menos 50% das nossas vendas de veículos eletrificados”.

Além disso, o etanol continua com o protagonismo no país, segundo o presidente da Anfavea.

Márcio ainda mostra uma conta indigesta: O faturamento do setor é de R$ 400 bilhões mas só com a burocracia tributária gastam-se R$ 4 bilhões, R$ 5 bilhões por ano. 

"Se nós faturamos R$ 400 bilhões, a carga tributária é em média de 40%, então nós estamos falando de R$ 160 bilhões de tributos arrecadados", calcula o presidente da Anfavea.

Márcio de Lima também é vice-presidente jurídico, tributário e de relações institucionais da Stellantis para a América do Sul, presidente do conselho automotivo da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) e faz parte do 'conselhão' da Presidência da República. 

A seguir, a entrevista de Márcio de Lima Leite na íntegra: 

HL: Eu queria que você começasse falando um pouco, Márcio, sobre a sua vida até você chegar à Presidência da Anfavea, como foi essa jornada, foi muito árdua? 
 
ML: Olha, mas aí você está me deixando num campo em que eu adoro falar (risos). Bom, meu pai faleceu quando eu tinha 6 anos de idade, começa por aí. Ele tinha um sítio ao lado da fábrica da Fiat, em Betim, mas na época não existia a fábrica da Fiat, e ele olhava e falava assim “olha, está vendo aquela luz ali? Ali vai ser o grande sucesso”, e não tinha nada, tinha um sítio, a gente morava numa casinha de sítio, de final de semana, e eu acompanhei o processo, sempre fui um apaixonado com o setor automotivo, e vi uma fábrica nascer e o que uma transformação de uma fábrica dá de oportunidade para as pessoas. Então, eu comecei a minha carreira, na época a minha mãe ficou viúva muito nova, com 4 crianças, e foi estudar, fez Direito, teve uma carreira muito bem-sucedida e colocou a gente para ter muita essa formação… 
 
HL: Você era o mais novo ou o mais velho? 
 
ML: Eu era o mais novo, o caçula. E aí eu sempre tive muito apoio nisso e um olhar muito do que a Indústria Automobilística consegue permear na vida das pessoas. Então, os fornecedores e a fábrica de Betim, e é óbvio, eu falo com propriedade, porque é a que eu conheço de perto, mas isso aconteceu no Brasil de uma forma geral, o Paraná e todos os lugares tiveram uma história parecida com essa. Minha formação é em Ciências Contábeis e em Direito, eu estudei na PUC e sempre com o olhar para a Indústria Automobilística. Comecei muito cedo na Fiat, com 20 e poucos anos de idade, e por lá enveredei meu caminho até chegar à Anfavea, o que não estava nos meus planos, ser Presidente da Anfavea, quando eu comecei foi algo inesperado, e hoje eu só tenho a agradecer pelo momento, pela experiência e por tudo que está acontecendo no setor automotivo, o ano ado foi um ano mágico para todos nós, Helenice. 
 
HL: Foi, não é? Números que foram surpreendentes até para o setor, e desafiadores, agora, para manter em cima dessa base tão alta, não é, Márcio? 
 
ML: É, e principalmente a gente não pode perder essa oportunidade. A gente sempre fala que o Brasil muitas vezes não perde uma oportunidade de perder uma oportunidade, e nós não podemos deixar isso acontecer. O Brasil cresceu em termos de emplacamento 14%, em produção a gente cresceu 10% no ano ado, esse ano a gente já está crescendo 15% e o mundo muito menos. O mundo cresceu 2%, se pegar os principais países do mundo, e o Brasil 14%, é uma diferença muito grande. Então, o Brasil tem um crescimento e um longo caminho para trilhar, com bastante conforto e bastante segurança em relação aos números. Nós vamos ter um 2025 também com crescimento, a gente estima 6%, mas esse número pode surpreender positivamente, é claro que temos desafios, mas esse número pode surpreender. 
 
HL: Agora, sobre o seu trabalho, você já está há quase 3 anos na Anfavea, é uma associação que representa as Indústrias do setor automotivo e de veículos leves, né, carros, caminhões, ônibus, máquinas agrícolas, máquinas de construção, quer dizer, é um leque, um portfólio imenso de indústrias com presença em vários Estados brasileiros. Como tem sido essa atuação sua numa entidade que é o ponto entre o setor, o Governo e o Mercado? É um desafio grande, não é? 
 
ML: Primeiro, de onde que nasce a posse dessa atual diretoria? Pela primeira vez em toda a história do setor nós fizemos a posse em Brasília, a gente estava saindo da pandemia, foi feita uma posse para mais de 500 pessoas, o Congresso estava em peso, o Governo, e qual era a mensagem que estava por trás disso? Não era uma posse como a gente estava habituado a fazer em Monte Líbano, que era legal, mas em outro contexto, a gente queria dizer o seguinte: a gente quer a Indústria em Brasília, a gente quer apresentar a Indústria para as autoridades. Havia um desconhecimento e ainda há, muito grande, um desconhecimento e um descolamento entre as pessoas que fazem Políticas Públicas e a Indústria, o real conhecimento, e no momento que a gente a por transição tecnológica, quem está pensando a Política Pública tem que conhecer a Indústria, ele tem que saber o que é um carro híbrido, o que é um carro elétrico, um híbrido plug-in, o que isso representa nos fornecedores, nos empregos, então nós fizemos essa posse e colocamos uma sede da Anfavea em Brasília. 
 
HL: Que é o centro de decisão de tudo do país, né. 
 
ML: De tudo. Então, foi muito bem-sucedido esse movimento, não foi um movimento do Márcio Lima, a Anfavea estava imbuída nisso, tanto é que os outros fabricantes também fizeram estruturas em Brasília, coisa que eles não tinham, principalmente na época da pandemia houve um esvaziamento e depois eles voltaram para Brasília com muito mais força. E aí tem um pecado, que é qual é o histórico? É o Mensalão, Lava Jato, muitas pessoas se distanciaram de Brasília, muitas empresas, por tudo o que aconteceu, só que nós não podemos nos esconder, ou seja, nós temos uma vida pautada pela ética, pelo respeito, por gerar empregos, e nós temos que ir para a guerra 
 
HL: Ainda mais numa indústria que é enorme, tem cadeias longas de produção. Você estava falando, a cada 1 emprego na Indústria Automotiva são gerados 9 empregos indiretos, quer dizer, o setor emprega 1 milhão e 300 mil pessoas, não dá para simplesmente fechar o olho para essa geração de renda toda no país. Então, como fazer esse elo para o Governo entender a real importância do setor automotivo? 
 
ML: Primeiro, uma relação de confiança que a gente tem com o Governo e proximidade. A gente não tem agenda para pedir, sabe, Helenice? Eu acho que esse, talvez, seja um dos maiores problemas que historicamente o setor privado é visto. Eu me lembro de uma reunião que eu tive em Brasília logo que eu assumi a presidência da Anfavea, que foi uma reunião muito importante, e nessa reunião eu apresentei dos desafios o que estava acontecendo, e ao final da reunião o Ministro falou comigo “tá, mas e aí, o que eu faço?” Eu entendi naquela mensagem, muito claro, que na próxima reunião que eu tivesse eu teria que levar a sugestão, a proposta, e depois falar do problema, e nós começamos a fazer isso, nós encomendamos para várias instituições internacionais estudos sobre solução. Então, se tem um problema, a gente leva o problema com a solução. “Olha, essa daqui é uma solução que nós entendemos que parte disso pode ser aproveitado”. 
 
HL: É uma sugestão. 
 
ML: É uma sugestão. Aqui tem dados, tem comparação com outros países, tem legislação de outros países, modelos que deram certo e que deram errado, mas houve um diálogo e essa construção foi muito apreciada, tanto é que na sequência a Anfavea foi convidada a fazer parte do famoso ‘conselhão’ do Lula, da Presidência da República. Nós temos, também, participação ativa na CNI, coisa que a gente, até então, não tinha tanto, a Anfavea funcionava… até tinha, mas era um pouco mais isolado. Procuramos estar muito próximos de Fiesp, Firjan, Fiemg, todas as confederações de uma forma geral, as federações. 
 
HL: Eu sinto que no programa Mover, também, vocês tiveram um protagonismo enorme de ter a solução, de ter os parâmetros de o Governo regulamentar aquilo a tempo para o setor sentir uma previsibilidade, um ambiente de negócios bom para poder investir tudo isso aí que tem previsto para os próximos anos, R$ 180 bilhões de reais. Esse volume é para o próximo ciclo de investimento de 5 anos, como está delineado esse investimento? 
 
ML: São 5 anos. Em algum momento algum investimento intercala com outro, mas essa é a nossa análise para 5 anos de investimentos. Só que esse número vai aumentar, Helenice. 
 
HL: Por quê? 
 
ML: A Anfavea tem recebido várias empresas chegando ao Brasil que não estão nessa conta, e elas querendo saber como funciona, entender o ambiente regulatório. 
 
HL: Essas empresas são fábricas também de veículos, autopeças ou fornecedores? 
 
ML: Os dois. Então, o Brasil tem um mercado muito grande, a taxa de veículos por habitante ainda é muito baixa. 
 
HL: É 1 veículo para cada 4, 5 pessoas. 
 
ML: Exatamente, é muito pouco. O transporte público, nós estamos falando de transporte público, vamos pegar máquinas autopropulsadas, o programa PAC é mais de R$ 1 trilhão de investimento e tem acontecido, a gente pode questionar de uma forma ou de outra, isso aqui não é o ideal, poderia ser assim ou assado, mas são programas que tem acontecido. 
 
HL: O setor agropecuário também é pujante, não é? 
 
ML: Nós vamos bater recorde, esse ano, de produção de grãos. 
 
HL: A representatividade do setor agropecuário no PIB está salvando a lavoura. Então, também tem um crescimento enorme de máquinas agrícolas. 
 
ML: É, no ano ado não foi bom com máquinas agrícolas, esse ano está um pouco ainda em ritmo lento, mas o setor de construção cresceu muito, teve um grande crescimento muito em função dessas obras, das licitações, do que que está acontecendo aí no PAC, mas as máquinas agrícolas, infelizmente a taxa de juros ainda é um grande dificultador para esse setor dar uma alavancada. 
 
HL: É, vamos esperar essa queda na taxa de juros, mas me conta, Márcio, dá para você adiantar algumas empresas que estão vindo, de quais países que elas vão instalar fábricas aqui no Brasil, e principalmente quais regiões, assim, que estão no radar? 
 
ML: A gente não pode falar, realmente, o nome das empresas nem o país, porque a gente acaba por eliminação… mas existe, principalmente, asiáticos chegando, porque quando você constrói barreiras, e os Estados Unidos tem feito isso e outros países também, o Brasil é um país amigável, o Brasil tem um ótimo relacionamento, seja com a China, com os Estados Unidos ou com a Europa, haja vista aí o acordo Mercosul e União Europeia, então o Brasil tem uma grande oportunidade, e por mais que o cenário seja desafiador, o Brasil não pode perder essa oportunidade. No meio dessa confusão, nós vamos sofrer pressão, principalmente, das importações, mas também o Brasil tem a oportunidade de alavancar as exportações. 
 
HL: Você disse sobre essa pressão das importações e você estava fazendo um histórico, antes o carro elétrico não tinha nenhum imposto, era 0, depois ou para 18% e agora o setor já está pedindo um imposto aí de 35%, não somente o setor automotivo, mas também o do aço. Eu conversei essa semana com o CEO da Gerdau, o Gustavo Werneck, e ele falou que o ideal seria um imposto de 35%, seria um ambiente mais saudável. O que o Governo acha, você já conversou com representantes do Governo sobre isso? Qual é o caminho? 
 
ML: Você tocou num ponto muito importante, porque a tarifa de importação de um carro a combustão é 35%, já é, e também era do carro elétrico. Há 5 anos houve uma redução a zero para carro elétrico e a 4% para carro híbrido. Então, isso era para o quê? Era para você despertar e ter um estímulo para a chegada dessas tecnologias no Brasil. Foi bem pensado, mas isso era para um momento específico, para dar aquela estimulada. O que aconteceu foi que isso permaneceu, e isso veio tem 5 anos com essas alíquotas, e logo quando começou a acontecer um volume muito grande de importação, eu estive com o Presidente Lula, com o Vice-Presidente Alckmin, também falamos isso muito sobre isso no Congresso, que isso estava criando um desbalanceamento na Indústria, na produção, e isso foi muito bem recebido e houve a recomposição da tarifa que era 0 para 35%, mas ela acontece de fase escalonada, de forma que a gente vai chegar em 2026 com a alíquota de 35%. Então, chegou a 18%, agora em julho já sobe um pouquinho mais para 25% e a gente chega a 35% em 2026. 
 
HL: Mas será que não é o momento de antecipar essa alíquota diante do que está acontecendo com os Estados Unidos? 
 
ML: É o que nós estamos pedindo. Por que é o momento? Porque em todo esse movimento nós não estamos pedindo sobretaxa, isso é muito importante, os Estados Unidos e a Europa estão aplicando sobretaxa, o Brasil não. O que nós estamos pedindo é a recomposição da tarifa que havia sido zerada, voltar ao que já era, o que nós estamos pedindo é que volte àquela alíquota original. Então, eu estive na semana ada com o Vice-Presidente Alckmin, com o Ministro Haddad também, conversando ali nos corredores e pedindo que acelerasse todo esse processo, porque a produção nossa está ficando comprometida. No ano ado nós tivemos um crescimento, a produção cresceu um pouquinho, e nesse ano a mesma coisa. 
 
HL: Me chamou a atenção um número, o Brasil deixou de arrecadar R$ 6 bilhões com essa importação, é isso mesmo, Márcio? 
 
ML: 1 bilhão de dólares, R$ 6 bilhões, e nós estamos, nesse momento, falando de um ajuste fiscal, de déficit com geração de empregos. Nós precisamos gerar empregos e nós estamos importando, porque houve, Helenice, um movimento de antecipação das importações. Existem, hoje, cerca de 60 mil veículos elétricos em estoque nos Portos. 
 
HL: Para aproveitar essa alíquota… 
 
ML: Para aproveitar essa alíquota. E isso cria o quê? Isso cria condições comerciais não compatíveis. Até pouco tempo atrás a gente tinha carro 2023 para ser vendido, zero, e você acaba gerando uma pressão que não é uma pressão correta, porque em uma você está gerando emprego, você está investindo em pesquisa e desenvolvimento, e na outra traz uma importação com a alíquota baixa, muitos trouxeram com a alíquota zero, que ainda se valeram da alíquota anterior, com subsídios nos países de origem. 
 
HL: Com custo de produção bem menor que o nosso. Isso não é dumping? 
 
ML: O processo de dumping não é tão simples, mas o processo de dumping ocorre muito quando você tem vendas abaixo do preço de custo de produção, ou que você tenha preços diferentes quando comparados aos mercados onde aquele fabricante atua. A União Europeia entrou com um processo que é de subsídios, é muito parecido com dumping, mas é um processo do subsídio, e nessa avaliação os principais fabricantes chineses foram condenados. Então, o que a Anfavea está fazendo? Nós queremos entender esse processo, não é uma questão de que a Anfavea irá entrar com um processo antidumping, a Anfavea estava acompanhando a investigação e está acompanhando ainda hoje os detalhes do julgamento na União Europeia que acabou sendo o motivo de condenação desses fabricantes. 
 
HL: Ou seja, já existe um precedente. 
 
ML: Um precedente, exatamente, nas mesmas condições. Então, nós estamos atentos a todos esses movimentos para analisar se há ou se não há prática de dumping no Brasil. 
 
HL:  Mas aí, Márcio, você estuda, então, entrar com essa ação antidumping ou ainda está colhendo mais elementos para tomar essa decisão? 
 
ML: Quem entra com pedido, na verdade, é o Governo Brasileiro. Quem deve mover qualquer investigação é o Governo Brasileiro e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. O que a Anfavea tem feito é colaborar com todos os processos, em todos eles, todas as Políticas Públicas. Eu te falei da descarbonização, nós contratamos os estudos e nesse processo, também não é diferente, a gente está aí estudando para ver se tem ou se não tem prática anticompetitiva, anticoncorrencial. 
 
HL: Até o momento desse estudo vocês já chegaram a alguma prévia? 
 
ML: Ainda não temos. 
 
HL: Isso demora quanto tempo ainda? 
 
ML: Eu acredito que uma análise preliminar do estudo deve sair neste semestre, mas não sei a data ainda. 
 
HL: Mas aí é o Governo Federal que tem que apresentar essa queixa, né? 
 
ML: Ele vai analisar e vai entender se tem ou se não tem razões para pleitear medidas de compensação. 
 
HL: Agora, quanto à antecipação, a volta do imposto de importação a 35%, em vez de ser 2026 ser agora ainda em 2025, você acha que tem grandes chances de o Governo já voltar com essa taxação esse semestre ainda ou não dá para cravar, assim, uma data? 
 
ML: Acho que dá sim, vai voltar esse semestre, pelo menos é o que a gente tem visto. O que aconteceu nesse período? Quando a gente fala “pera aí, então você está mudando a previsibilidade, já que era em 2026 você está trazendo para agora?” Não. Houve mudança de cenário, os Estados Unidos elevarão a alíquota para 100%, o carro elétrico hoje paga 100% nos Estados Unidos, a Europa até 48%, o Canadá 100%, a Índia 100%, então os países se protegeram. Quando os países elevaram, não é recomposição de tarifa, eles criaram uma sobretaxa, o que está acontecendo? O Brasil ou a ser destino, virou alvo, então o Brasil tem que dar uma resposta, porque se não der uma resposta são os nossos empregos que estão em jogo. 
 
HL: Aí é tudo, né, porque até no aço, você falou… o que o Brasil produz em 1 ano são 12 dias do aço na China, quer dizer… 
 
ML: E há pouco tempo nós produzíamos mais aço do que a China. 
 
HL: Pois é, na década de 1970 era uma outra situação. Então, aí vai ficando inviável nos empregos e em tudo, fornecedores, então é uma coisa que vai ter que ser imediata. 
 
ML: Nós, fabricantes de veículos, temos uma preocupação muito grande com os nossos fornecedores, nós não podemos errar a mão, e quando nós erramos a mão nós pagamos caro por essas escolhas. Vários países perderam a força das suas Indústrias e a força dos fornecedores. Vou te dar um exemplo, quando se muda a tecnologia, os desafios são muito maiores, aconteceu isso com a transmissão automática, nós tínhamos a transmissão manual, o Brasil tinha grandes fornecedores de câmbio e quando vem a tecnologia da transmissão automática, o Brasil não conseguiu acompanhar e nós nos tornamos reféns das importações, e até hoje o Brasil é o oitavo produtor de veículos no mundo e nós importamos câmbio automático, nós não temos. 
 
HL: Não tem a tecnologia nacionalizada aqui? 
 
ML: Tem a tecnologia, mas nós não conseguimos viabilizar a produção local. Então, quando se muda uma tecnologia, corre-se o risco de um grande impacto nos fornecedores, porque você deixa de comprar dos fornecedores locais e a a importar. Você pega em Minas Gerais, hoje nós temos um raio, aqui próximo de onde nós estamos, algo em torno de mil fabricantes, mil empresas. 
 
HL: É, num raio de até 180 km mais ou menos. 
 
ML: E quantas empresas dessas podem ser afetadas por uma tecnologia caso a gente não consiga fazer uma transição energética privilegiando os nossos fornecedores? Então, tem que ser uma política que tem essa equação bem-feita. Isso acontece em São Paulo, no Rio de Janeiro, em todo lugar. 
 
HL: Em todo lugar que tem Indústria e até mesmo para evitar a migração desses investimentos, que se corre o risco. Eu me lembro que no final de 2023, quando ainda não estava aprovado o Mover, você falou que tinha esse risco, que eram bilhões, mais de R$ 100 bilhões, como está acontecendo agora, que tem que ter um rumo para que se mantenha esse ambiente de negócios. 
 
ML: Sem dúvida, porque os investimentos que nós estamos fazendo é o maior ciclo de investimentos da história do setor automotivo, mas nós estamos fazendo esses investimentos trabalhando com a recomposição de tarifa, trabalhando com mercado em crescimento, então nós temos que acompanhar tudo isso e o Governo tem que estar atento a isso para que não haja um desequilíbrio. No ano ado nós importamos 467 mil veículos, é maior do que o mercado da Argentina. 
 
HL: E ao mesmo tempo a gente tem um mercado nacional que está bom, não é? A inadimplência caiu, a venda financiada aumentou, os emplacamentos também, você falou também do volume de 14 milhões e 200 mil veículos emplacados entre usados e novos, é claro. 
 
ML: Para nós, se o veículo é novo ou usado é um problema secundário, o mais importante é que esses automóveis estejam sendo objeto de aquele que tem um carro mais velhinho, comprou um carro um pouco mais novo, ele vai comprar o zero. Nós vendemos no Brasil, no ano ado, 14 milhões e 200 mil veículos, é o maior número da história do país, então isso é um dado importantíssimo, crescimento de 14,1% é um dado importantíssimo. Nós estamos com a média diária de emplacamento muito boa, começamos 2025 também com crescimento, em janeiro cresceu 6% em relação ao ano ado. 
 
HL: Essa taxa SELIC em alta, que todo mundo está esperando que pode até chegar a 15%, ela pode tirar o fôlego do consumidor que quer, esse ano, comprar um veículo? 
 
ML: Pode. O nosso setor depende muito do crédito, mas eu não acredito, nós não acreditamos que isso irá acontecer neste ano de 2025, ainda continua com o crescimento. Agora, juros são complexos, se a gente não tiver uma sinalização e não tiver uma política para que essa curva se inverta, ela acaba tendo impacto sim nas nossas vendas. 
 
HL: Quando você mostra aquele histórico de vendas de veículos, Márcio, é plug-in híbrido, o híbrido que tem o etanol, e aí a combustão toda, o que a gente pode esperar dessas tecnologias trabalhando entre elas? Vai ter mercado para todo mundo? 
 
ML: Vai ter. O Brasil, primeiro, quando a gente fala, e me perguntam muito sobre o elétrico no Brasil, o Brasil não é elétrico, é eclético. Nós vamos ter todas as tecnologias no Brasil, nós vamos chegar em 2035 com mais ou menos 50% das nossas vendas de veículos eletrificados. Quais são esses veículos eletrificados? Nós vamos ter o híbrido plug-in, que é aquele híbrido na tomada, mas principalmente o híbrido convencional, que é aquele híbrido que tem um motor a combustão e uma boa bateria. Essas duas fontes de energia convivem e elas não requerem um investimento muito grande em infraestrutura, então vai ser o maior volume de vendas no país e o etanol, sem dúvida, vai ser o grande apoio nessa descarbonização. 
 
HL: O etanol continua com o protagonismo que sempre teve aqui no Brasil, com toda essa infraestrutura, os postos de combustíveis todos, a capilaridade, ele vai continuar com essa posição de destaque? 
 
ML: Ele aumenta, pelos próximos anos ele aumenta. 
 
HL: Por quê? 
 
ML: Primeiro, há uma política de estímulo ao uso do etanol, ela começa com uma política, inclusive, de conscientização, porque muitas vezes os jovens não sabem que ao abastecer fazendo a opção pelo etanol, você está fazendo a opção por um ambiente mais sustentável. 
 
HL: Energia limpa tem sequestro de CO2 lá na plantação de cana. 
 
ML: Esse desconhecimento é muito grande, hoje um garoto paga mais caro em uma roupa que é ecologicamente correta, ambientalmente correta, e muitas vezes isso não chegou no nosso setor, a turma ainda não sabe disso. Então, há uma grande mobilização, conversamos muito com o Ministro Alexandre da Silveira, Ministro de Minas e Energia, conversamos muito em Brasília sobre a necessidade dessa política de conscientização e aumento do consumo do etanol na bomba. Isso é em prejuízo ao veículo elétrico? Em hipótese alguma, o carro elétrico tem uma contribuição gigante na descarbonização, é uma tecnologia nova, deve ser usada e abusada, mas ele, em decorrência da nossa infraestrutura, e por não ter uma política fiscal, como teve os Estados Unidos, onde eles gastaram 50 bilhões de dólares para estimular o carro elétrico, quer dizer, nós não temos condições de fazer isso, então como nós temos o etanol, que responde muito bem a questão da descarbonização, ele tende a crescer nos próximos anos. 
 
HL: Isso é bom. 
 
ML: É claro que é um período de transição, pode ser que na frente tenha-se uma outra tecnologia. 
 
HL: Vocês trabalham para estimular esse consumo do etanol, fazer uma campanha nacional, seja com Governo, seja com as empresas, as montadoras, as Indústrias, as fábricas, como vocês gostam de falar agora, tem alguma estratégia para mostrar que a gente já tem essa energia limpa aqui? 
 
ML: É mais do que uma ideia, é um compromisso, porque todos os fabricantes têm que apresentar os seus planos e metas de descarbonização, todos eles, e o uso do etanol talvez é a forma mais econômica e pronta de se fazer essa entrega do projeto de descarbonização. Então, existe sim, existe um trabalho muito grande em andamento e uma força muito grande, uma comunhão de interesses, o Governo quer, a Indústria Automobilística quer, as locadoras querem, todos querem uma resposta para descarbonização e o etanol é o nosso principal aliado em massa, em volume. 
 
HL: Márcio, sobre a renovação de frota, como é que está essa campanha? Eu me lembro que no Rota 20/30 tinha uma grande aposta nisso, e com o Mover, como é que está essa campanha? Porque o carro velho, com mais de 10 anos de uso, ele já está poluindo muito mais o meio ambiente, e no momento em que a gente está  discutindo COP30 aqui no Brasil, todo esse programa com todos esses tópicos aí em busca dessa energia limpa, o que a gente vê aqui no Brasil sobre essa situação? Ainda é preocupante? 
 
ML: Não dá para enxugar gelo, Hoje, muitas vezes a gente está enxugando gelo, porque a gente cobra da Indústria Automobilística, o que é correto, tem que cobrar mesmo, para oferecer produtos com altíssima eficiência em termos de descarbonização, só que essas tecnologias custam caro, então elas vão aumentando o preço do automóvel. 
 
HL: Tem que ter um investimento altíssimo, não é? 
 
ML: E isso resulta em quê? No preço maior do carro para o consumidor. 
 
HL: A gente vê fábricas aí gastando R$ 2 bilhões para fazer um carro do zero com o investimento já todo voltado… 
 
ML: Sem dúvida. Esse investimento de R$ 180 bilhões, boa parte dele é para descarbonização. Agora, isso é correto? É correto, isso é uma questão de ética, de responsabilidade e não tem a menor dúvida disso. Agora, fechar os olhos para a frota circulante não é ético, não é correto. Hoje, um carro usado emite, em média, 23 vezes mais do que um carro novo, então a gente fala de descarbonização pensando apenas nos carros que são vendidos. Nós vendemos, por ano, 2 milhões e 600 mil veículos, a frota circulante é de 43 milhões, então nós precisamos acelerar o processo de renovação da frota, nós precisamos acelerar a inspeção técnica veicular que faz parte desse processo, a reciclabilidade, o que é colocado nas ruas tem que voltar, nós não podemos continuar dependendo apenas da extração mineral, nós temos que reciclar esses carros. Nos pátios do Detran, Helenice, são 2 milhões de veículos parados nos pátios do Detran, então tem que acelerar esse processo de reciclabilidade e de renovação da frota. 
 
HL: Criar um estímulo para compra, para renovar essa frota, né. 
 
ML: Sem dúvida. 
 
HL: Não teria uma saída mais rápida dessa substituição? 
 
ML: Ele faz parte do Mover, faz parte do programa, ainda é parte, e nós fabricantes, todos nós temos uma estratégia para isso. Por quê? Porque nós somos medidos também por isso dentro do programa Mover. Então, nós estamos trabalhando com isso, o Governo também precisa acelerar uma política mais firme em termos de inspeção técnica veicular, os Estados, porque não é o Governo Federal, é o Governo Federal e os Estados.  
 
HL: Cada Estado tem a sua legislação. 
 
ML: Exatamente. E acelerar, há 2 anos foi feito um programa muito legal de renovação de frota de veículos pesados. Esse vai sair primeiro, mas infelizmente ele acabou tendo um recurso limitado e não conseguiu dar continuidade, mas vai acontecer. 
 
HL: Me conta uma coisa, você está no fim do mandato na Anfavea, acabando agora em abril você já faz a mudança da liderança. Vai haver uma modificação aí nessa condução da Anfavea? Porque antes eram os presidentes das fábricas que assumiam a presidência da Anfavea, aí houve também uma outra mudança com os vice-presidentes. Agora, vai ser um profissional, como está esse entendimento, Márcio? Já se chegou à conclusão disso ou ainda faltam alguns detalhes? 
 
ML: O que acontece é que a grande dificuldade é você ter um presidente vindo de montadora, de fabricante, conciliando com esse momento de tanta demanda do setor automotivo, a demanda é gigante. No ado, qual era a discussão que você tinha? Era se o carro era popular, não era popular… 
 
HL: Os órios ou não… 
 
ML: Os associados iam juntos em todas as demandas, hoje não, é momento de extremo desafio para o setor automotivo na área de máquinas, na área dos leves e dos pesados. Então, a Anfavea chegou à conclusão da importância de se ter um executivo profissional dedicado apenas à Anfavea. Hoje a minha agenda, eu trabalho 18 horas por dia, sábado, domingo direto, porque é impossível você conciliar duas agendas, isso aconteceu com todos os que me antecederam, isso faz parte, né. Então, esse movimento existe, mas eu me distanciei um pouco dele até porque tantas coisas que a gente tem que entregar como Anfavea, então nós contratamos uma empresa, os Vice-Presidentes da Anfavea contrataram uma empresa para fazer esse processo de transição e ver qual vai ser a melhor solução. Então, eu não tenho participado ativamente. 
 
HL: Então, ainda tem tempo para saber quem vai substituir você, não é? 
 
ML: Tem ainda muita coisa que vai rolar, mas eu não tenho dúvida de que vai ser alguém melhor, a única definição é de que vai ser alguém melhor, agora quem será ainda não sabemos. (Recentemente, a Anfavea anunciou a nomeação de Igor Calvet como seu novo presidente executivo. Márcio de Lima deixa o cargo no dia 21 de abril próximo) 
 
HL: A Anfavea representa 26 empresas no setor, as chinesas estão voltando, quer dizer, já vieram no ado e agora estão vindo com mais afinco. Elas vão fazer parte da Anfavea, como está esse entendimento, assim, de elas se associarem também? 
 
ML: Olha, eu vejo como uma questão natural. Depois, quando vai ser esse momento é uma outra história, porque nesse agora, quando a gente fala de recomposição tarifária, eu entendo que seja uma pauta mais vinculada aos fabricantes tradicionais do que aqueles que estão chegando agora, então é natural que não se tenha uma aproximação, mas nós temos um ótimo relacionamento com essas empresas e essas empresas estão vindo para produzir no Brasil, nós fazemos uma grande distinção como Anfavea. Nós defendemos importação? Nós defendemos a importação, nós fabricantes importamos e nós achamos que a importação é muito importante para trazer tecnologia. 
 
HL: O carro não é 100% nacional, a gente não produz chip, semicondutores, isso tudo tem que ser importado. 
 
ML: Exatamente, mas a gente não pode ter um desequilíbrio nas importações, e esses que estão chegando agora tem planos robustos de industrialização no Brasil. Então, os nossos interesses são convergentes com esses mais representativos no mercado, hoje, naturalmente alguns desses que estão chegando irão se filiar a Anfavea, eu imagino. 
 
HL: Quando instalarem a fábrica, né, quando abrirem a fábrica. 
 
ML: Pelo estatuto da Anfavea tem que ser quando tiver fábrica já funcionando, mas também não sei se eles terão interesse nesse momento, mas em algum momento mais à frente eu não tenho dúvida que isso pode acontecer. 
 
HL: E a expectativa é que essas novas fábricas, que você falou que estão vindo, vão ser montadoras ou fabricantes no Brasil? Ou vão trazer o carro de lá, como a gente tem historicamente outros exemplos, para só montar o veículo aqui? Ou não, vai ser uma tecnologia, com um índice de nacionalização acima de 50%, uma equipe de engenheiros também, como a gente vê nas outras empresas aqui no Brasil que investem num Centro Tecnológico, que já produzem motores e tudo mais de um carro e até exportam essa tecnologia para outros países? Como está esse entendimento, assim, e essa pressão das associadas em relação a sua atuação? 
 
ML: O programa Mover e a Reforma Tributária, que foi aprovada agora no Congresso, trouxe um ponto na legislação importante, que é a necessidade da confecção de etapas fabris no Brasil. Então, não é apenas falar que vai produzir, por que o que é produzir no Brasil? Você pode trocar a roda de um carro e falar que é produzir, você pode colocar um retrovisor num carro que é produção, de acordo com a legislação do IPI, que é de produtos industrializados ele é uma produção. Agora, o que nós trabalhamos durante toda a elaboração do Mover e da Reforma Tributária é que haja um conceito mais maduro do que é essa produção. Produção tem que ter investimento em pesquisa e desenvolvimento, tem que ter realização de etapas fabris, empregos, uma preocupação com fornecedores e isso nós estamos aguardando a regulamentação por parte do Poder Executivo, e nós temos cobrado muito isso do Governo. 
 
HL: Ainda não foi regulamentada essa parte do Mover? 
 
ML: Não, e não foi da Reforma Tributária, que é o imposto seletivo que traz quase uma legislação espelho do Mover para dentro da Reforma Tributária. 
 
HL: O que falta para ter essa regulamentação? O que o Governo alega para você quando você pergunta para eles?  
 
ML: Não, é complexo mesmo. Eu entendo a posição do Governo, nós entendemos e nós temos a ansiedade natural de quem está investindo R$130 bilhões, e também os fornecedores outros R$ 50 bilhões. Nós precisamos de urgência e é o que nós temos falado com o Governo. Tivemos com o Ministro Alckmin na semana ada uma reunião muito produtiva, todas as montadoras com ele e ele nos assumiu o compromisso de sair com isso o quanto antes. Agora, esse o quanto antes não tem uma data definida, mas na mesma hora ele já pegou o telefone e ligou, conversou também com o Ministério da Fazenda, sempre no intuito de acelerar, porque ele sabe do reflexo que isso tem para a liberação dos nossos investimentos, então há um movimento nesse sentido. 
 
HL: Márcio, em relação à produção de caminhões, como ela tem se desenvolvido ao longo dos últimos anos? Ela também está tendo um resultado bom ou poderia ser melhor? 
 
ML: O ano de 2023 foi um ano muito baixo, por quê? Porque nós tivemos uma mudança na regulamentação de emissões, de 2022 para 2023, que é o Euro 6. Essa mudança antecipou muito as vendas, então na virada do ano, de 22 para 23, nós produzimos muitos caminhões, vendemos muitos caminhões de forma que a rede estava estocada ainda, nos pátios das montadoras havia muito estoque e as próprios clientes frotistas compraram muitos caminhões na tecnologia anterior, porque encareceria o preço do caminhão, a tecnologia nova. Então, o ano de 2023 foi um ano marcado por altos estoques e por uma demanda muito mais baixa de caminhões, e, consequentemente, de produção. Demanda nem tanto, mas produção, porque tinha um estoque. Quando chegou no ano de 2024 a nossa produção chegou a crescer 40%. É um número excepcional? É, quando analisamos em percentual, mas lembrando que 2023 tinha sido um ano baixo. 
 
HL: Em cima de uma base fraca. 
 
ML: Exatamente, mas está bem, nós tivemos a Fenatran no ano ado onde nós realizamos muitos negócios, foi a maior Fenatran realizada até hoje, que é a Feira de Mobilidade e de Transporte de Cargas, esse ano também caminhões começou muito bem, agora, a venda de caminhões é vinculada a juros e PIB, então nós esse ano estamos acompanhando, começou bem, mas precisamos entender o que vai acontecer agora em fevereiro. 
 
HL: Pode melhorar, né. 
 
ML: Pode melhorar. 
 
HL: O Salão do Automóvel, conta as novidades! Gente, vai ter esse ano em novembro, não é? Agora confirmadíssimo, no Anhembi, em São Paulo. 
 
ML: Confirmadíssimo, contrato assinado. O Anhembi é a nossa casa, onde tudo começou, ele foi todo reformado, está lindo, maravilhoso, e nós vamos fazer o melhor Salão do Automóvel. Por quê? É muita tecnologia, então nós estivemos agora na CES, em Las Vegas, fazendo diversas parcerias, vendo o que se tem de tecnologia nesses salões. 
 
HL: Mudou muito, o salão do automóvel? 
 
ML: Muito, é outra coisa. 
 
HL: Qual é a principal mudança que vai desembarcar aqui no Brasil em novembro? 
 
ML: Eu acho que além de carros, nós estamos falando de tecnologia, de soluções para mobilidade, plataformas em todos os sentidos, de locação, de tudo. É uma nova realidade que não tinha naquele salão de 2018, que foi o último que a gente fez. Então, terá o test drive, você vai pegar o carro, você vai ter experiência com o carro, contato, então isso é muito legal, vai ter muita tecnologia que não é ligada diretamente ao automóvel, mas indiretamente, tem um compromisso do meu amigo Cláudio Sahad, Presidente do Sindipeças, de a gente ter aí grandes estandes do setor de autopeças, até para a gente falar das tecnologias que são produzidas no Brasil. 
 
HL: É, porque o setor depende de autopeças, né. 
 
ML: E nós queremos apresentar para o mundo soluções que temos no Brasil  
 
HL: O que, aliás, é um volume grande, R$ 50 bilhões são investimentos de autopeças, de fábricas de autopeças para acertar toda essa tecnologia aí que está vindo, precisa ter, né? 
 
ML: Precisa ter, e precisa apresentar o porquê dos nossos investimentos. Todos querem saber para onde vão as tecnologias no Brasil e para onde estão indo esses investimentos, o que a gente vai fazer com R$ 180 bilhões. Lá atrás, na época do Inovar-Auto, era fácil, você falava “eu estou aumentando a produção”, agora não, nós estamos mudando de uma tecnologia A para uma tecnologia B. 
 
HL: Toda uma transição. Dá para a gente imaginar ficar entre os 5 maiores produtores do Mundo? Esse ano, 2024, já foi um ano bom, estamos em oitavo lugar, em licenciamento em sexto lugar no mundo, mas aí eu fiquei vendo lá o ranking dos números da Anfavea, e claro, parabéns, palmas para eles que estão na nossa frente, países até do BRICS, como a Índia, com uma produção de mais de 4 milhões de unidades, mas o que precisa para a gente voltar ao top5, assim, ter esse protagonismo maior? 
 
ML: A Índia caminha com uma força muito grande. 
 
HL: É incrível, viu, e é referência em qualquer setor, em qualquer Indústria. 
 
ML: É, a Índia tem crescido muito. Agora, o Brasil tem uma Indústria formada, as pessoas têm capacidade, os trabalhadores, nós temos recursos, e o Brasil, eu acho que com pouco esforço pode subir muito. Quando nós fizemos a coletiva do final de ano, Helenice, nós íamos apresentar 3 milhões de veículos no Brasil. 3 milhões é um número mágico, a gente sempre falou em 3 milhões, muda o Brasil de patamar. 
 
HL: Sempre foi a meta, né? 
 
ML: Sempre foi a meta, e a gente ia anunciar 3 milhões (de unidades). Quando vem essa taxa de juros, nós recuamos de novo para 2,65 milhões, então isso é um impacto muito grande, mas o Brasil voltará em breve aos 3 milhões. 
 
HL: Esse ano você acredita? Ou não, com essa taxa de juros altíssima, inflação em alta, esse momento geopolítico mundial bem complicado? 
 
ML: Não, para esse ano a nossa estimativa é fechar em 2,85 milhões, mas pode surpreender. Para quem está em 2,85 milhões, subir um pouquinho já bate nos 3 milhões, não pode é descer, então a gente não acredita nisso. 
 
HL: Deus me livre, né? 
 
ML: É aquela situação, tudo que foi conquistado, nós não podemos abrir mão disso, foi com muito esforço de todos do setor, muito investimento, enfrentamos e desbravamos muita coisa, a legislação, foi muito importante na legislação o Marco das Garantias, que por um lado a gente tem um aumento na taxa de juros, no spread, por outro lado a gente vai reduzir o custo dos spread em função do programa do Marco das Garantias, que o cliente negocia direto com o Banco e o Banco pode retomar o bem em caso de inadimplência sem a necessidade de ação judicial. 
 
HL: É extrajudicial então. 
 
ML: Extrajudicial, isso acaba facilitando, porque reduz o spread, o custo bancário principalmente para os bons pagadores. 
 
HL: E aí mais gente tomando emprestado dinheiro para financiar, por isso que deu esse resultado esse ano tão bom, não é? 
 
ML: É, e esse ano também esse mecanismo, essa modalidade vai ganhar mais força. Então, se por um lado tem um aumento de juros, por outro lado a gente tem outras iniciativas para minimizar isso. 
 
HL: Márcio, você como presidente da Anfavea, claro que conversa com acionistas do mundo inteiro dessas fábricas todas que estão aqui que tem dinheiro fora do país. Qual é a visão deles? Têm visões muito díspares ou não?  Eles elogiam o Brasil pelo consumidor que tem, que é diferente de Estado para Estado, então tem espaço para produtos diferentes aqui ou o pessoal olha com o pé atrás, assim, na questão política? Como fica essa visão dos acionistas? 
 
ML: Eu, de uma forma geral, vejo que todos veem o Brasil sempre como uma grande oportunidade, e nesse momento de mudanças e questões geopolíticas, o Brasil ocupa uma posição muito boa. É claro que tem aqueles países que têm uma preferência por um Governo de esquerda, por um Governo de direita, isso é natural e depende de onde está a sede da matriz, mas o Brasil é visto como, realmente, um grande potencial de investimento. Eu acho que a gente deu sinais muito fortes para o Mundo de que as nossas instituições são fortes, né, Helenice. A gente critica e fala muita coisa, mas as nossas instituições são fortes. O Brasil adquiriu um nível de maturidade muito importante, mas o Brasil deu sinais fortes de como as nossas instituições estão maduras, e o Brasil maduro para receber esses investimentos. 
 
HL: E o Brasil tem sido, assim, um motor de sustentação de muitas fabricantes de veículos mundo afora. 
 
ML: Sem dúvida. As principais estão aqui, o interesse no Brasil é sempre prioritário. Algumas coisas assustam os investidores, principalmente quando a gente fala de segurança, né. A segurança é uma coisa que os incomoda muito e talvez o Brasil não tenha conseguido ainda equacionar essa questão e talvez a gente esteja ainda um pouco longe. 
 
HL: A segurança que você fala é jurídica? 
 
ML: Pública e jurídica também, um bom ponto, a segurança pública e a segurança jurídica, as duas elas incomodam bastante os investidores, mas eu acho que a gente tem caminhado bem para ter um país melhor. 
 
HL: É onde tem para crescer, né, na venda de veículo é o Brasil. 
 
ML: Sem dúvida. 
 
HL: Que ótimo, Márcio! Bom, a gente já está terminando, e o que você enxerga, assim, para a sua atuação daqui para frente no setor? 
 
ML: Eu vejo tudo com muita serenidade, eu tenho uma posição, sou Vice-Presidente da Stellantis, já uma vida aí de muitos anos, tenho um trabalho muito forte com o nosso Presidente Emanuele Cappellano, que é um grande amigo, um querido. 
 
HL: Ele esteve aqui, deu show! 
 
ML: Ele é espetacular.  E eu quero continuar contribuindo com o setor de uma forma bastante ativa. Hoje, eu coordeno a Câmara Automotiva da Fiemg, tenho outras participações também em outras Federações, na própria CNI, no ‘conselhão’, então a ideia é continuar contribuindo com o setor e é uma coisa que eu faço com muito prazer, na própria Anfavea também, eu continuarei na Anfavea. A gente ter a oportunidade de contribuir é algo realmente muito rico, e a gente não pode ter medo, Helenice. Essa vontade de fazer acontecer, eu continuo como se estivesse entrando no primeiro dia na Anfavea, é a vontade de fazer acontecer. A Anfavea, hoje, tem duas sedes novas, uma sede em São Paulo, no melhor ponto de São Paulo, ponto de tecnologia, e nós temos a sede em Brasília, que a gente quer muito, cada vez mais, que aquilo seja uma referência para um bom debate, um debate 100% republicano, técnico, com a ideia de gerar empregos, com isso a minha ideia é continuar contribuindo e ar o bastão para outro que tenha um gás ainda maior do que o meu e que tenha maiores qualidades. 
 
HL: Mas, assim, você trabalhou bem e agora falta o Brasil exportar um pouquinho mais, né, Márcio, eu acho que dá para melhorar aqueles índices lá da exportação, acho que tem muita contribuição. 
 
ML: E é muito perigoso ver números frios. Vou te dar um exemplo, nós crescemos 52% da exportação em janeiro, então a gente fala em bater palmas, mas é mais ou menos, nós crescemos, porque o mercado da Argentina cresceu, o mercado lá cresceu muito no 2º semestre, mas nós perdemos participação nos principais países. Nós perdemos participação no Chile, na Colômbia, no México, então os asiáticos estão entrando também nesses países. 
 
HL: Ou seja, a cada carro um é da China. 
 
ML: Da Índia também. E muitas vezes somos nós mesmos, nós concorremos, nós fabricantes tradicionais concorremos conosco mesmo, porque muitas vezes a gente acaba vendendo dentro da América Latina por outras plantas da nossa própria empresa que estão em países como México, Japão, China e Índia, e a gente acaba colocando os nossos produtos aqui. Então, trabalhar para maiores e melhores acordos comerciais é o grande ponto, não dá para a gente lançar um produto no Brasil e ficar 6 meses tentando homologar esse produto no país de destino e gastando milhões de dólares com burocracia, não dá, e aí você pega outros países colocando produtos nos nossos mercados com uma velocidade muito maior e um custo muito mais baixo, porque não tem o custo de todo o processo da burocracia. 
 
HL: E o consumidor quer novidade, o consumidor quer coisas novas para ver e acaba comprando mesmo. 
 
ML: E a tecnologia não nos assusta, nós temos, sabemos fazer, mas a burocracia muitas vezes acaba atrapalhando a nossa competitividade. 
 
HL: E não depende da Indústria, porque a Indústria para dentro da porta é muito competitiva. 
 
ML: Nós podemos e temos a obrigação de colaborar, nós temos que colaborar, porque muitas vezes o Governo não sabe, então cabe ao setor privado apresentar também soluções, porque o Brasil somos nós, né. 
 
HL: A pressão tem que partir de nós. 
 
ML: E soluções. Então é isso que nós temos trabalhado muito. 
 
HL: É, a burocracia ainda tem muito chão pela frente, né, Márcio? 
 
ML: Muito. Nós gastamos, só com controle na área fiscal, 1,2% do nosso faturamento. O nosso faturamento de R$ 400 bilhões significa que só com a burocracia tributária nós gastamos R$ 4 bilhões, R$ 5 bilhões por ano jogados fora. 
 
HL: Aqui no Brasil? 
 
ML: Jogados fora com burocracia. 
 
HL: Que não vai voltar, esse dinheiro. 
 
ML: Não vai voltar. Imagina isso sendo colocado nas escolas para formação de técnicos, para capacitação, quantas pessoas menos favorecidas que a gente podia estar pegando e oferecendo um plano de treinamento para essas pessoas. 
 
HL: Na região onde a fábrica está instalada, né? 
 
ML: Claro. Então, nós precisamos mudar, ao invés de colocar esse recurso na burocracia, colocar esses recursos onde gera emprego, que vai ter a melhora da qualidade da educação, da saúde, menos violência, maior qualidade da mão de obra, então é isso que nós temos que avançar, mas devagar tem avançado, o Brasil tem avançado. 
 
HL: E me fala outra coisa também, uma coisa que eu gosto muito de comparar é a arrecadação de impostos, você tem esse número aí de cabeça, assim, do quanto que o setor arrecadou no ano ado, desse faturamento quanto que ele teve que entregar em impostos? 
 
ML: Olha, a conta não é difícil. Se nós faturamos R$ 400 bilhões, a carga tributária é em média de 40%, então nós estamos falando de R$ 160 bilhões de tributos arrecadados. 
 
HL: Nossa, é muita coisa. 
 
ML: Fora o carro usado que tem o IPVA, o consumo de combustível. 
 
HL: Seguro, tudo que ele vai ali no encalço, manutenção do carro… 
 
ML: Ele vai gerando uma cadeia, né, o setor automotivo é 20% do PIB industrial, 5% do PIB do país, então é uma força muito grande.