Cocar no poder

Três mulheres indígenas estão à frente de cargos importantes no Brasil

Sonia Guajajara está à frente do primeiro ministério voltado para os povos originários; Célia Xakriabá é primeira mineira indígena e deputada federal; e a Funai tem Joenia Wapichana como primeira presidente do sexo feminino

Por Raquel Penaforte
Publicado em 14 de fevereiro de 2023 | 23:30

Três mulheres. Três etnias. Três indígenas. Em 2023, Sonia Guajajara, Célia Xakriabá e Joenia Wapichana realizam um feito inédito: am a ocupar, ao mesmo tempo, espaços de extrema relevância na política e na história do Brasil. Pela primeira vez, três mulheres líderes de povos indígenas assumem, juntas e em diferentes órgãos e instituições, cargos significativos para o contexto social e ambiental.

 

Sonia é a primeira indígena a chefiar um ministério (a pasta dos Povos Indígenas também é nova, foi criada em 2023). Célia é pioneira como deputada federal indígena eleita por Minas Gerais; e Joenia se tornou a única presidente mulher e indígena da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), ao longo de décadas. Elas chegam com o desafio de despertar um novo olhar sobre a urgência de proteger os povos originários. “A partir de agora, essa invisibilidade não pode camuflar nossa realidade. Estamos aqui de pé para mostrar que não iremos nos render”, afirmou Sonia no dia da posse como ministra. Ela criticou o que chamou de “plano de genocídio dos povos indígenas” e destacou como essa população ficou vulnerável diante dos avanços do garimpo ilegal e da falta de políticas públicas contra a Covid-19.

 

Sobre a crise Yanomami, Sonia defendeu a ação continuada envolvendo diferentes órgãos.

 

“É a retomada da presença do Estado no território. E é preciso que seja um trabalho articulado com vários ministérios. Por isso foi instaurada uma comissão de enfrentamento. A ideia é que o Ministério da Defesa permaneça ali, com essa presença de fiscalização, juntamente com o Ministério da Justiça, com a Polícia Federal, garantindo a estrutura das aeronaves para o monitoramento. Não é um trabalho pontual”, disse, em entrevista à Empresa Brasil de Comunicação (EBC). 

 

Alguns compromissos da pasta são garantir aos indígenas o à educação e à saúde, demarcar territórios e combater as mortes. Segundo Sonia, a crise Yanomami “é uma pontinha do iceberg, diante de tantos casos que estão ainda invisibilizados” no país.

 

Demarcação

 

Sobre a demarcação de terras indígenas – uma das maiores urgências dos povos originários –, Sonia Guajajara afirmou que há 14 processos prontos para homologação pelo governo federal. São áreas localizadas em oito Estados. “Temos 14 processos identificados, que estão com os estudos prontos, concluídos, já têm a portaria declaratória. A gente espera que o presidente Lula possa a homologação”, disse. Essas terras prontas para o reconhecimento definitivo ficam no Ceará, Bahia, Paraíba, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Acre, Amazonas e Mato Grosso.

 

Célia Xakriabá

 

Eleita como deputada federal pelo PSOL, em Minas, com 101.154 votos, Célia Nunes Correa é da terra indígena Xakriabá. Nasceu em 1990, em Itacarambi (Norte de Minas). Integrou a primeira turma de educação indígena no Curso de Formação Intercultural para Educadores Indígenas, pela Universidade Federal Minas Gerais (UFMG), e se tornou mestre em desenvolvimento sustentável na área de concentração em sustentabilidade junto a povos e terras tradicionais pela Universidade de Brasília (UnB). É doutoranda em antropologia na UFMG. Promete um trabalho em parceria com o de Sonia. “Estamos articuladas e preparando esse encontro para pensarmos juntas o futuro da bancada do cocar: no Congresso, Funai, ministério e Sesai. É a força coletiva das mulheres indígenas!”.

 

Joenia Wapichana

 

Ex-deputada federal pela Rede Sustentabilidade, de Roraima, é advogada e a primeira mulher indígena a assumir a presidência da Funai, em 55 anos de história da fundação. A Funai é o órgão federal responsável pela política indigenista brasileira, que tem como objetivo a proteção e promoção dos direitos das diferentes etnias do país. Joênia Batista de Carvalho, pertencente ao povo indígena Wapichana, nasceu em abril de 1973, na comunidade Truaru da Cabeceira, região do Murupu, em Boa Vista (RR). “A Funai foi bastante desmantelada, sucateada. Houve muita falta de investimento, principalmente no sentido de ser um órgão responsável por mais de 14% do território brasileiro, principalmente em relação à demarcação e invasão de terras indígenas.”

 

Sonia Guajajara

 

É a primeira deputada federal indígena eleita pelo Estado de São Paulo, em 2022, com mais de 150 mil votos. Assume o Ministério dos Povos Indígenas, que terá a missão de defender os cerca de 900 mil povos originários. Pertencente ao povo Guajajara/Tentehar, Sônia Bone de Sousa Silva Santos nasceu em 1974, na terra indígena Arariboia, no Maranhão. É formada em letras e em enfermagem pela Universidade Estadual do Maranhão (Uema) e pós-graduada em educação especial. Também foi coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), além de ser membro do Conselho da Iniciativa Inter-Religiosa pelas Florestas Tropicais do Brasil (programa das Nações Unidas). Em 2022, foi eleita pela revista norte-americana “Time” uma das 100 pessoas mais influentes do mundo.