DOENÇAS RARAS

Mães relatam dificuldade de matrícula e apoio nas escolas

Apesar de a Política Nacional de Educação Especial preconizar o às instituições, crianças não são tão bem recebidas

 

Aos 4 anos, Dominique Sousa ainda não sabe o que é ir para a escola. Não é porque more em um local de difícil o ou os pais tenham se recusado a matricular o filho em uma instituição de ensino. Com uma doença rara em investigação e sequelas deixadas pelas inúmeras crises epilépticas sofridas ao longo da vida, é como se ele não se encaixasse no ensino regular, na visão da mãe dele, Raíssa Souza, que nem sabe mais a quem recorrer.

“É como se não tivesse escola para ele. As de inclusão estão preparadas para as demandas de deficiências conhecidas e estudadas, como autismo, por exemplo. Mas ele não tem um diagnóstico fechado, mesmo com a gente buscando vários profissionais. Nas escolas municipais próximas da nossa casa estou na fila de espera desde o ano ado. E na Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) eu já tentei várias vezes. Fui lá, entrei com a papelada. Primeiro não tinha vaga, depois não tinha cuidador para ele”, conta Raíssa. 

Assim que ele nasceu, já teve uma forte crise de epilepsia, com falta de oxigenação no cérebro, e ficou internado por um ano e meio. “Meu filho não responde bem neurologicamente. Não me vê direito e sabe que sou eu pelo cheiro e pela voz. Precisa de cadeira de rodas para se locomover e se alimenta por meio de sonda pela dificuldade de engolir”, descreve a mãe. A cada nova crise epiléptica, alguma função é afetada no corpo do menino. Sem descobrir a real causa do problema, uma vez que os médicos apenas detectaram que ele tem uma doença rara, sem se saber qual, o tratamento é para amenizar os sintomas e dar qualidade de vida. “Vamos no escuro, fazendo exames para acompanhar a situação do cérebro e fazendo terapias possíveis, como fonoaudiologia”, diz a mãe. 

Outra criança afastada da escola é Ana Júlia Lima, 8. Ela vive com microcefalia, uma síndrome rara que causa anormalidades no crescimento do cérebro e afeta cerca de 21 de cada 100 mil nascimentos. Apesar de a menina ter nascido durante a epidemia da doença, em 2016, período em que as autoridades de saúde deram mais atenção à causa, oito anos depois, o sentimento é de abandono. Além das complicações neurológicas, Ana tem malformações nos órgãos dos sistemas digestivo e respiratório, crises epilépticas sem controle e uma luxação no quadril, que a impede de frequentar as aulas, segundo a mãe, Juliana Lima, 37. “A luxação do quadril está ligada à paralisia cerebral. Ela não pode ficar muito tempo sentada na cadeira porque machuca, então não vai à escola. O SUS nos atende de forma precária, e o município oferece o mínimo. Estamos esquecidas e sobrecarregadas”, denuncia Juliana.

Em janeiro, uma das esperanças da família sofreu um golpe: o projeto de lei que prevê apoio financeiro de R$ 60 mil para crianças de até 10 anos que nasceram com microcefalia foi vetado pela Presidência da República, que alegou a necessidade de uma estimativa de impacto orçamentário e financeiro. Agora, o texto volta ao Congresso Nacional. “É a nossa perspectiva de qualidade de vida. Além de ser justa a reparação social, já que o Estado não fez o controle do vetor da zika”, afirma.

Igor Silva Mendes, atualmente com 12 anos, teve uma experiência diferente com a escola. Na época, aos 2 anos, a convivência com crianças da mesma idade foi o que começou a evidenciar suas diferenças. A mãe, Fabiana Márcia da Silva Mendes, 47, foi orientada a levar o filho a uma consulta com uma neuropediatra, que poderia investigar os atrasos no desenvolvimento do menino. Após um relatório escolar repleto de observações como “não alcançou o esperado”, um exame genético revelou a raridade: Igor nasceu com um distúrbio cromossômico ainda não nomeado pela ciência.

“No início, foi muito difícil aceitar. A escola culpava o Igor, dizia que ele não conseguia segurar um copo. Foi ali que decidi aprender mais sobre educação inclusiva”, relata a mãe. Igor agora segue uma rotina de diversas terapias para estimular seus sentidos e sua cognição. Mas não foi só a vida dele que mudou. Fabiana formou-se em pedagogia e ou a dar aulas na mesma escola do filho. “Voltei para a faculdade por ele. Não com a intenção de alfabetizá-lo, mas para entender o processo de inclusão, para que isso não ficasse apenas nas mãos dos outros”, explica.

A Secretaria Municipal de Educação de BH disse em nota adotar a “recomendação para inclusão de crianças e adolescentes com deficiência e doenças raras” vinda da Política Nacional de Educação Especial. Ainda segundo a pasta, não há filas para estudantes com doenças raras na rede municipal de educação. “As matrículas são compulsórias e podem ser realizadas em qualquer época do ano. Todos os alunos com deficiência ou doença rara que necessitam de recursos pedagógicos íveis recebem o atendimento na própria escola”. A Secretaria de Estado de Educação de Minas garante atuar de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e com a Lei Brasileira de Inclusão, assegurando um “sistema educacional inclusivo em todos os níveis”, respeitando “o direito de serem matriculados, preferencialmente, nas escolas regulares de ensino”.