NA FRONTEIRAS DAS GERAÇÕES

Tolerância a assédio no trabalho é menor na Geração Z

Busca da nova geração por um ambiente de trabalho mais saudável tem exigido dos gestores mais habilidades no trato humano com os funcionários

 

A geração Z é a menos tolerante ao assédio no emprego. Segundo a pesquisa “Perspectivas Intergeracionais no Mercado de Trabalho”, realizada pela DATATEMPO/FECOMÉRCIO em fevereiro de 2025, este é o principal motivo para jovens de 16 a 30 anos pedirem demissão, apontado por 35,5% dos entrevistados. Para os millennials, de 31 a 42 anos, esse percentual cai para 26,7%. 

“É um reflexo de uma maior conscientização. As gerações anteriores também sofriam assédio, mas a Z vem muito mais preparada para reagir”, destaca o presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos – Seção Minas Gerais (ABRH-MG), David Braga, lembrando que eles são mais conectados e têm mais o à informação.

Essa busca da nova geração por um ambiente de trabalho mais saudável tem exigido dos gestores mais habilidades no trato humano com os funcionários. Oséias Rodrigues, 32, gerente de uma loja de vestuário masculino em um shopping de Belo Horizonte, é um exemplo de líder que precisou se reinventar para gerenciar uma equipe de 13 vendedores, com idades entre 20 e 25 anos. Com nove anos de trajetória na mesma empresa, ele vivenciou a transição de vendedor a gestor e aprendeu, na prática, que o modelo autoritário de liderança não funciona mais.

Quando foi promovido a gerente, Oséias reproduziu o estilo de gestão que conhecia: o comando pela bronca. “Meu antigo chefe me repreendia, e eu simplesmente ia lá e fazia o que era pedido. Quando assumi a liderança, adotei o mesmo tom rígido, mas percebi que isso não funcionava mais. Hoje, se eu agir assim, o colaborador pede demissão e vai para a concorrência”, relata o gerente.

Oséias reconhece que, no início, não sabia lidar com a equipe de forma adequada. “Já aconteceu de eu chamar um vendedor para conversar e ele sair chorando, porque eu não soube me comunicar da maneira certa”, ite. Para ele, a falta de preparo para assumir cargos de liderança é um problema comum no varejo. 

Professor da Escola de istração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-Eaesp), Anderson Sant’Ana explica que esse erro comum às empresas é por falta de conhecimento dos ciclos de vidas, perfis e preferências individuais de carreiras. 

“Muitas vezes não preparamos esse indivíduo para essa posição. Nós pegamos, inclusive, o melhor vendedor, o transformamos em supervisor e vamos perder os dois porque o indivíduo gosta de vender, não quer ficar lá preso numa tabela. Então, você perde um ótimo vendedor e ganha, às vezes, um péssimo supervisor. Porque ali já não é mais habilidade técnica, o preponderante são as ‘soft skills’, as habilidades humanas, é lidar com gente. Um gerente não faz, ele faz (o outro) fazer”, argumenta Sant’Ana.

“Foi um conhecimento que tive que buscar por conta própria, com leituras, cursos e muita reflexão. Aos poucos, entendi que liderança não se faz a ferro e fogo”, explica Oséias, que, hoje, adota postura completamente diferente. “Meu time até brinca que sou tranquilo demais. Alguém pode me tirar do sério de todas as formas, e eu continuo sereno. Depois, chamo a pessoa para uma conversa particular, com calma e respeito. Agora, entendo que meu papel como líder é ajudar meus colaboradores a alcançar seus sonhos e objetivos. Preciso saber o que eles buscam além de pagar as contas. É um trabalho de conexão, de dar sentido ao futuro deles. Se não faço isso, não consigo reter a equipe”, reflete.

Diversidade

Para a especialista em recrutamento da Selpe Fabiana Santos, a convivência entre gerações no mercado de trabalho não é apenas um desafio, mas uma oportunidade para as empresas se reinventarem. “As gerações mais jovens querem se sentir desafiadas, mas também valorizam um ambiente que respeite suas necessidades individuais”, analisa.

Ela defende que as organizações repensem seus modelos de gestão e criem espaços de diálogo para integrar diferentes visões. “Quando há transparência, as gerações conseguem se complementar e contribuir para um ambiente mais inovador e produtivo”, afirma.

Essas premissas motivaram a marca para a qual Oséias trabalha a valorizar a diversidade. A equipe dele, por exemplo, é composta por pessoas de diferentes origens, crenças e estilos. O próprio Oséias é um exemplo dessa autenticidade. “Você acha que qualquer outra loja aqui no shopping contrataria um gerente com dread?”, diz ele, apontando para o cabelo. “Os jovens de hoje procuram empresas que estejam alinhadas com seus valores. Durante as entrevistas, eles questionam sobre diversidade e inclusão, algo impensável no ado. Na minha época, o foco era ganhar dinheiro e ter uma vida confortável”, compara Oséias.

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