CULTURA

Congados e Reinados são reconhecidos como patrimônio cultural de Minas Gerais

Evento com danças, gastronomia e arte no Palácio da Liberdade marcou a oficialização do título

Por Raquel Penaforte
Publicado em 03 de agosto de 2024 | 16:32

Quando construída, em 1897, a Praça da Liberdade, localizada hoje na região Centro-Sul de Belo Horizonte, tinha como objetivo homenagear a emancipação da República da Coroa Portuguesa. Hoje, cerca de dois séculos depois deste evento, um novo grito de liberdade foi dado: o reconhecimento dos Congados e Reinados como patrimônio cultural de Minas Gerais. 

As manifestações repletas de sincretismo religioso, que unem a fé cristã às memórias das culturas africanas, (trazidas e aqui preservadas e adaptadas pelos escravizados e seus descendentes), agora fazem parte do acervo cultural mineiro. Neste sábado (3), além da do documento, uma grande festa no Palácio da Liberdade reconheceu, disseminou e celebrou a afromineridade.

"Acho que esse palácio está mais livre hoje. E também mais protegido. Porque, pela força da lei e do reconhecimento do patrimônio histórico, a gente protege e reconhece essas expressões. Esse povo (do Congado e Reinado) está mais protegido, para que as manifestações que eles desenvolvem tenham, através da história, permanência", pontuou o secretário de Estado de Cultura e Turismo, Leônidas de Oliveira.

Na sexta-feira e no sábado (02 e 03 de agosto), os jardins do Palácio da Liberdade foram tomados por ternos - grupos de Congados e Reinados de Minas Gerais. Com seus tambores, chocalhos e outros instrumentos, além de indumentárias, 36 ternos cultuaram e professam a fé em São Benedito, Santa Efigênia e em Nossa Senhora do Rosário. 

O capitão-mor do Reinado dos Arturos, seu José Bonifácio da Luz, aos 75 anos, assume uma importante missão: rear a história. Seja para os novos membros do quilombo ao qual ele pertence ou para as pessoas que desconhecem a cultura congadeira do Estado. 

“Só hoje, muitas pessoas chegaram e perguntaram ‘o que é isso?’, ‘o que está acontecendo aqui?’, então, a gente explica. Eu acho que muita gente nem respeitava tanto porque não conhecia. Então é um reconhecimento para nós e para toda população”, afirmou.

 

História de luta contra o preconceito racial

Se antes, os ritos religiosos vindos do outro continente precisavam ser confundidos com os praticados pelos católicos, a cor da pele não nega a origem dessa cultura. Majoritariamente compostos por pessoas negras, o reconhecimento dos Congados e Reinados como patrimônio também escancaram um problema secular: o racismo.

Para o diretor de proteção e memória do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), Adriano da Silva, o título de patrimônio cultural é um o na luta anti racista.

“O reconhecimento histórico tem muitas importâncias. Tecnicamente, a gente poderia resumir no plano de salvaguarda que é produzido quando a gente faz o registro de um patrimônio imaterial, que são ações que o Estado tem que se comprometer e se compromete com políticas públicas para essa cultura não se acabar. Mas, além disso, tem algumas importâncias que vale ressaltar, como o simbolismo da luta e resistência desse povo africano, que foi escravizado, sendo reconhecido e valorizado, neste momento, é um grande avanço contra o racismo”, pontuou.

O vice-governador do Estado, Professor Mateus, também destacou a significância deste marco na valorização da tradição e da ancestralidade negra no Estado. 

"As primeiras festas de congado são do ano de 1697, conduzidas, obviamente, pelas comunidades escravas daquele momento. O reconhecimento e luta pela libertação, que inclusive compõem os enredos das congadas, é uma forma de reconhecer e valorizar o papel anterior e presente da cultura afromineira na formação do que é Minas Gerais. Então, eu tenho certeza que esse marco é uma forma de demonstrar a integração necessária deste Estado multicultural que é Minas Gerais, que os negros são parte importantíssima da construção da nossa história. Isso tudo mostra que eles foram, são e sempre serão parte da cultura de Minas Gerais", afirmou o vice-governador Mateus Simões.

Segundo a Secult,  na próxima semana, será aberto um edital de afromineiridade. A pasta também prevê mapear o afroturismo do Estado.